palavras aos homens e mulheres da Madrugada

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Leitura dos Clássicos

“E o que é um ‘clássico’? É um texto que expressa, de maneira clara e adequada, intuições e conhecimentos que fazem parte da natureza essencial do ser humano.”
Luiz Gonzaga de Carvalho

Fernando Pessoa define os três gêneros de artistas

Do Arquivo Pessoa:

Os 3 géneros de artistas

1. O artista para quem a arte é uma necessidade como que física, directa, como são a de comer e a de beber. Para este a arte é uma função da vida.

2. O artista para quem a arte é um refúgio, um modo de esquecer a vida; como um narcótico, um vício qualquer, um álcool.

3. O artista para quem a arte é uma tarefa, uma missão a cumprir.

Do 1.º género são homens como Shelley, Byron – como o «romântico», em geral.

Do 2.º género são homens como Verlaine, Baudelaire, e outros assim (incluir Maupassant).

Do 3.º grupo são os grandes criadores como Milton.

Fernando Pessoa

A viagem astral de Machado de Assis

Machado de Assis costumava publicar crônicas sob diversos pseudônimos. Apenas 40 anos após sua morte descobriu-se que, entre eles, encontrava-se o pseudônimo “Lelio”. Imagino que o utilizava quando sua abordagem do tema ultrapassava seu parâmetro normal de deboche. A crônica abaixo — Balas de Estalo — foi publicada no jornal Gazeta de Notícias, edição do dia 5 de Outubro de 1885, e trata de um tema então em moda: o espiritismo. Nele, Machado relata uma suposta viagem astral com um desenlace dos mais inesperados…

Eça de Queiroz e o médium

Estou me divertindo com a Hemeroteca Digital Brasileira. Muito bom ter acesso a tantos jornais e revistas antigos. Estava pesquisando uma informação dada por José J. Veiga, no livro Relógio Belisário, que cita o jornal Cidade do Rio, e acabei encontrando essa outra notinha das mais interessantes. Trata do encontro, em Paris, entre os escritores Eduardo Prado e Eça de Queiroz e um médium local. O jornal data de 21 de Maio de 1896.

Uma conversa sobre literatura com Olavo de Carvalho

Em 2008, durante um encontro literário promovido pelo Digestivo Cultural, nosso editor, Julio Daio Borges, me apresentou a outro escritor dizendo o seguinte (não sei se ele se lembra): “Esse é o Yuri. Aquele que conversa com o Olavo de Carvalho“. Ainda sorrio quando me lembro disso…

Segue abaixo, para provar que Julio dizia a verdade, um pequeno trecho retirado das 11 horas de podcast que gravei com Olavo em 2006, no qual falamos sobre o papel do escritor na sociedade e a importância da literatura. Vale a pena ouvir até o fim, são apenas 15 minutos.

Publicado no Digestivo Cultural.

Hilda Hilst na TV Cultura: “Este livro é uma banana”

O Caderno Rosa de Lori Lamby não é um livro, é uma banana que estou dando para os editores, para o mercado editorial.” — Hilda Hilst.

Entrevista concedida em 1990.

Milan Kundera fala da grafomania e do choque entre universos literários

 

Milan Kundera

Alguns dias mais tarde, Banaka [o escritor] fez sua aparição no café. Completamente bêbado, sentou-se no tamborete do bar, caiu dele duas vezes, tornou a se sentar, pediu uma aguardente de maçã e deitou a cabeça no balcão. Tamina percebeu que ele chorava.

— O que está acontecendo, senhor Banaka? — perguntou ela.

Banaka ergueu para ela um olhar lacrimoso e apontou com o dedo para o peito:

— Eu não sou, você compreende? Eu não sou! Eu não existo!

Depois foi ao banheiro e do banheiro diretamente para a rua, sem pagar.

Tamina contou o incidente a Hugo, que, à guisa de explicação, mostrou-lhe uma página de jornal em que havia muitas resenhas de livros e, a respeito da produção de Banaka, uma nota composta de quatro linhas sarcásticas.

O episódio de Banaka, que apontava o dedo indicador para o peito, chorando, porque não existia, me lembra um verso de O divã ocidental-oriental de Goethe: “Estamos vivos quando outros homens vivem?” Na pergunta de Goethe se esconde todo o mistério da condição de escritor: o homem, pelo fato de escrever livros, transforma-se em universo (não se fala do universo de Balzac, no universo de Tchekhov, no universo de Kafka?) e o próprio de um universo é justamente ser único. A existência de um outro universo o ameaça na sua própria essência.

Dois sapateiros,desde que tenham suas lojas exatamente na mesma rua, podem viver em perfeita harmonia. Mas se começarem a escrever um livro acerca da vida dos sapateiros, eles vão logo incomodar um ao outro e fazer entre si a pergunta: Um sapateiro está vivo quando vivem outros sapateiros?

Tamina tem a impressão de que um só olhar estranho pode destruir todo o valor de seus diários íntimos, e Goethe está convencido de que um só olhar de um só ser humano que não esteja presente nas linhas da sua obra coloca em questão a própria existência de Goethe. A diferença entre Tamina e Goethe é a diferença entre o homem e o escritor.

Aquele que escreve livros é tudo (um universo único para si mesmo e para todos os outros) ou nada. E porque nunca será dado a ninguém ser tudo, nós todos que escrevemos livros não somos nada. Somos desconhecidos, ciumentos, azedos, e desejamos a morte do outro. Nisso somos todos iguais: Banaka, Bibi, eu e Goethe.

A irresistível proliferação da grafomania entre os homens políticos, os motoristas de táxi, as parturientes, os amantes, os assassinos, os ladrões, as prostitutas, os prefeitos, os médicos e os doentes me demonstra que todo homem, sem exceção, traz em si sua potencialidade de escritor, de modo que toda a espécie humana poderia com todo o direito sair na rua e gritar: “Somos todos escritores!”

Pois cada um de nós sofre com a idéia de desaparecer, sem ser ouvido e notado, num universo indiferente, e por isso quer, enquanto ainda é tempo, transformar a si mesmo em seu próprio universo de palavras.

Quando um dia (isso acontecerá logo) todo homem acordar escritor, terá chegado o tempo da surdez e da incompreensão universais.

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Trecho d’ O Livro do Riso e do Esquecimento, de Milan Kundera.

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