— Funerária Blablablá, bom dia.
— Bom dia. São vocês que ficam ligando aqui em casa com uma gravação automática, não é?
— Sim, faz parte da nossa estratégia de marketing.
— E devo dizer que funciona, viu. Vocês costumam ligar justamente quando estou super concentrado, escrevendo ou lendo alguma coisa, totalmente esquecido de que a vida tem um fim.
— Ah, desculpe, não era nossa intenção incomodá-lo, se o senhor…
— Não, não. Está tudo bem. Eu realmente queria contratar o seu serviço.
— Ah, pois não. É uma precaução ou… ou o senhor precisa dos nossos serviços imediatamente?
— Pra já.
— Ah, sinto muito. Meus pêsames.
— Obrigado.
— De quem se trata?
— Do meu gato.
— Um animal?
— Sim, um gato, um felino, um siamês filho-da-puta.
Pausa.
— Desculpe, senhor, mas nós não lidamos com funerais de animais domésticos.
— Tem certeza? Porque eu já estava me preparando para matá-lo agorinha.
— Como? Ele está muito doente?
— Não, não. Ele só é chato demais. Era da minha irmã, sabe. Aí ela se casou, mudou e largou esse pentelho aqui. Eu gosto de bichos, mas gosto de bichos grandes, tipo um cavalo ou um cão de caça, desses que não ficam se esfregando na gente o tempo todo, querendo companhia, esse mimimi infernal. Porra, isso é bicho de mulherzinha sem filhos! Não tenho paciência maternal. A carência dele me irrita profundamente. Por isso, quero me livrar do maledeto e preciso da sua ajuda.
— Mas, senhor, eu… eu nem sei o que…
— Poxa, vocês ficam me enchendo o saco todo santo dia com esse negócio de morte, morte, morte, acabam me dando essa grande idéia, e agora não podem me ajudar? Eu moro num apartamento, não tenho onde enterrá-lo e não pretendo jogá-lo pela janela.
— Por que o senhor não o dá para alguém?
— E você acha que já não fiz isso? Essa porra desse bicho tem algum tipo de GPS. Quando vejo, já está lá na portaria me esperando. Parece um encosto peludo.
— Bom, senhor, não sei o que dizer. Não posso fazer nada.
— Pode, sim!
— Mas o que eu poderia fazer?
— Para resumir, por que vocês não enfiam essa tal de morte no rabo? Podem começar pelos caixões. E parem de me encher o saco! Já tenho este merda aqui para fazer isso. Preciso terminar meu livro.
“Desligou. Bom, vamos ver se esse pentelho está lambendo a água da torneira da cozinha de novo. Bicho nojento…”
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Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.