palavras aos homens e mulheres da Madrugada

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Hilda Hilst, o IPTU e a Chave da Cidade

Chave da Cidade

Quando Hilda Hilst faleceu, em 4 de Fevereiro de 2004, devia cerca de 800 mil reais de IPTU. Dois anos antes, a dívida era de 500 mil reais. Quando morei com ela, a dívida já era altíssima, salvo engano, aí pelos 300 mil reais. Mas, pouco antes de conhecê-la, quando a dívida já a assustava — ela caíra na armadilha de transformar uma área rural em loteamento, o que alterou o imposto de rural para urbano —, a Câmara de Vereadores de Campinas (SP) quis homenageá-la e, após votação, decidiu entregar-lhe a Chave da Cidade. Hilda foi então convidada para ir até a Câmara, mas deu de ombros: “Homenagem? Não quero homenagem, quero que revejam esse valor absurdo do meu IPTU”. Ela ganhava apenas 2000 reais por mês…

Os vereadores a esperaram em vão. No entanto, como a coisa já estava feita, decidiram enviar um representante à Casa do Sol, residência da autora, onde ele, um vereador (se não me falha a memória, o presidente da câmara), chegou todo sorridente com aquela Chave enorme nas mãos. O porteiro do condomínio anunciou a visita do sujeito, deixando Hilda irritada.

“Que petulância!”

Ela então, como costumava fazer em momentos assim, preparou sua performance: foi até o quarto e se “disfarçou” de velhinha. Sim, à época Hilda já tinha quase 70 anos de idade, mas seu espírito jamais faria alguém confundi-la com uma “velhinha”. Por isso, pegou duma bengala, jogou um xale sobre os ombros, encurvou-se e saiu caminhando como velhinha caquética até a entrada da casa, onde o vereador a esperava.

“Dona Hilda!”, começou ele, efusivo. “Vim lhe entregar a Chave da…”

“E o meu IPTU?”, cortou ela, seca.

Ele, pego de surpresa, gaguejou: “Mas, dona Hilda, nós… eu não tenho poder para isso… Vim apenas porque a Câmara resolveu lhe prestar uma homena…”

“O senhor por acaso já leu meus livros?”

Agora sim ele ficou branco. Engoliu em seco: “Não, senhora, nunca li nenhum dos seus livros”.

“Então, ponha-se daqui para fora. Meus leitores já me homenageiam quando lêem meus livros.”

O vereador ofendeu-se:

“Vim até aqui de boa vontade lhe prestar uma homenagem, lhe fazer um favor, e a senhora…”

“Favor o senhor faria se me chupasse a cona”, berrou ela, brandindo a bengala.

O vereador ficou roxo, não sabia onde enfiar a cara.

“Por favor, retire-se da minha casa”, tornou ela, com dignidade. “Vocês querem que eu pague uma fortuna para morar na minha própria casa e ainda acham que vão me comprar com uma chave idiota que não abre porta alguma? Pois diga a seus pares que os mandei enfiar, um de cada vez, a chave em seus respectivos cus. O senhor faça o mesmo.”

E então, desfazendo a corcunda, deu as costas ao homem e, pisando firme, imponente, caminhou para dentro de casa.

Até hoje ninguém sabe em qual excelentíssimo fiofó foi parar a chave.

Swedenborg e o duplo de Maomé

UM DUPLO DE MAOMÉ
Já que na mente dos muçulmanos as idéias de Maomé e de religião estão indissoluvelmente ligadas, o Senhor ordenou que no Céu eles sejam presididos por um espírito que faz o papel de Maomé. Esse delegado nem sempre é o mesmo. Um cidadão da Saxônia, que em vida foi aprisionado pelos argelinos e que se converteu ao Islã, ocupou certa vez esse cargo. Como havia sido cristão, falou-lhes de Jesus e lhes disse que Ele não era filho de José, senão o Filho de Deus; foi conveniente substituí-lo. A condição desse representante de Maomé é indicada por uma tocha visível somente aos muçulmanos. O verdadeiro Maomé, que redigiu o Corão, já não é visível a seus adeptos. Disseram-me que os presidia no início, mas pretendeu dominá-los e foi exilado no Sul. Uma comunidade de muçulmanos foi instigada pelos demônios a reconhecer Maomé como Deus. Para aplacar o tumulto, Maomé foi trazido dos infernos e o exibiram. Nessa ocasião eu o vi. Parecia-se aos espíritos corpóreos que não têm percepção interior, e seu rosto era muito escuro. Pôde articular as palavras: “Eu sou vosso Maomé” e imediatamente afundou.

UN DOBLE DE MAHOMA
Ya que en la mente de los musulmanes las ideas de Mahoma y de religión están indisolublemente ligadas, el Señor ha ordenado que en el Cielo siempre los presida un espíritu que hace el papel de Mahoma. Este delegado no siempre es el mismo. Un ciudadano de Sajonia, a quien en vida tomaron prisionero los argelinos y que se convirtió al Islam, ocupó una vez este cargo. Como había sido cristiano, les habló de Jesús y les dijo que no era el hijo de José, sino el hijo de Dios; fue conveniente reemplazarlo.
La situación de este Mahoma representativo está indicada por una antorcha sólo visible a los musulmanes.
El verdadero Mahoma, que redactó el Corán, ya no es visible a sus adeptos. Me han dicho que al comienzo los presidía, pero que pretendió dominarlos y fue exiliado en el Sur. Una comunidad de musulmanes fue instigada por los demonios a reconocer a Mahoma como Dios. Para aplacar el disturbio, Mahoma fue traído de los infiernos y lo exhibieron. En esta ocasión yo lo vi. Se parecía a los espíritus corpóreos que no tienen percepción interior, y su cara era muy oscura. Pudo articular las palabras: “Yo soy vuestro Mahoma” e inmediatamente se hundió.

Emanuel Swedenborg, Vera Christiana Religio (1771).

Citado por Jorge Luis Borges e Bioy Casares no livro Cuentos Breves y Extraordinarios. (Tradução do trecho: Yuri Vieira.)

Cubão, o país do futuro do pretérito

Cubão

Tudo começou com o discurso dum candidato na TV: “Brasil é um nome muito capitalista — é o nome de um produto comercial! Pau Brasil! Vamos deixar esse negócio de Pau e mudar para Cubão”.

Dito e feito.

Uma estudante de intercâmbio é recebida pelos colegas:
— ¿De onde você é?
— Do Cubão. Antes da Revolução se chamava Brasil.
— Hum. Você é a primeira pessoa do Cubão que conheço.
— Obrigada. Aqui sou a única. Mas lá todo mundo é do Cubão. Igualdade é isso.

Um turista cubãozense é interpelado por um cidadão português:
— ¿O Partido dos Totalitaristas mudou o nome do seu país para Cubão em homenagem a Cuba?
— Não. Foi porque eles gostavam de enrabar o povo.
— Ah!

Em 2024, numa aula de história:
— ¿E o primeiro presidente eleito após a mudança do nome do país para Cubão foi…?
— Gisele Bundchen, ¿fessora?
— Não! Já disse mil vezes: Jean Wyllys! Jean Wyllys!
— Muito capciosa a sua pergunta, fessora…

Enquanto isso, na Itália:
— Nossa, aquele traveco deve ter uns dois metros de altura!
— Ê, Cubão!
— Como?!…
— ¿Tá me estranhando? É o país de origem! O país!
— Ah, é mesmo. São todos de lá. Mas ainda não me acostumei com a mudança. Gostava de Brasil. Soava bem.
— É, mas levaram tanto pau que tiveram de se adaptar…
— Cubão. Quem diria…

Um pouco de Maio, Junho e Julho…

Algumas pessoas não conseguem compreender certos fatos, não porque sejam burras, pois são até inteligentes, mas simplesmente porque lhes falta imaginação. A imaginação é a base da inteligência: o que não é imaginado torna-se impossível e, por isso, impensável. Quando uma pessoa recebe uma informação ou um dado da realidade que não tem eco em sua imaginação, ela não consegue alcançar senão uma “compreensão” verbal dos mesmos. De fato, essa “compreensão verbal” não é compreensão em absoluto. É estar preso a jogos de palavras, é encarar a linguagem como puro flatus vocis: vento sonoro. Para aquele que é incapaz de uma imaginação aprofundada, os conceitos utilizados não possuem substância. O reino do possível (do imaginável) é o primeiro passo em direção aos reinos consecutivos do verossímil, do provável e do verdadeiro. Sem imaginação é impossível escalar a montanha do Entendimento, essa que leva ao cume da verdade. A imaginação é o acampamento base: a fonte de recursos e provisões para a aventura filosófica.

É papel da literatura de imaginação tornar a realidade pensável.

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Engraçado, a Marcha para Jesus foi provavelmente a única manifestação sem a presença de Judas: segundo consta, apesar dos milhares e milhares de participantes, ninguém ali explodiu sequer um estalo de salão.

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Ei, broto, leia com a voz do Roberto Carlos: “São tantas manifestações”.

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Revoltou-se porque não aguentava mais ouvir promessas — então ouviu mais promessas e ficou satisfeito.

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Foi à rua protestar com o coração sincera e legitimamente indignado — mas a cabeça, após uma lavagem cerebral de anos, permanecia dominada.

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Saiu à rua porque não aguentava mais ser enganado — então a resposta do governo o enganou e ele ficou quietinho em casa.

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Sugestão de leitura para esses dias turbulentos: Os Demônios, de Fiódor Dostoiévski, na tradução de Paulo Bezerra.

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Terá lido Tolstói Os Demônios? Irônico como Dostoiévski previu, na figura de Stiepan Trofímovitch, a morte do colega durante uma fuga das mais ingênuas. A única grande diferença é que, enquanto agonizava, e ao contrário de Tolstói, o coitado do professor Vierkhoviénski finalmente compreendeu o sentido do verdadeiro Cristianismo.

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Essas críticas à polícia lembram as críticas ao “bombardeio cirúrgico” dos americanos na guerra do Iraque — o bom-mocismo quer 100% de precisão robocópica em meio ao caos.

Ora, Shit happens

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Mordido por um vampiro, o gigante levanta-se e sofre convulsões — tarde demais, seu sangue já está contaminado…

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Sugestão para cartaz de passeata: “Queremos álcool no Biotônico!”.

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Achávamos que os estádios não estariam de pé a tempo, mas, em vista do vandalismo, parece que serão as únicas construções de pé em 2014.

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Dr Jekyll vai protestar na passeata mas, coitado, não entende por que o vândalo do Mr Hyde tem sempre de quebrar tudo no final…

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A [pontinhos, pontinhos, pontinhos] foi um movimento espontâneo, antigovernamental, que se espalhou por todo o [pontinhos, pontinhos, pontinhos] , aparentemente sem liderança, direção, controle ou objetivos muito precisos. Geralmente é considerada como o marco inicial das mudanças sociais que culminaram com a [pontinhos, pontinhos, pontinhos]. → http://bit.ly/1923VmX

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Não sei por que os gays gayzistas (os gays normais não são melindrosos) estão reclamando da tal “cura gay” — parece que o remédio é um supositório deste tamanho.

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Redes sociais, esse Maelstrom do século XXI.

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Matéria fueda na revista Alfa: “O Cabra Sensível”. Fala sobre como o Bolsa Família retirou o poder dos homens, tornando-os submissos às “patroas”. Como só a mulher recebe a grana (ou em pelo menos 90% dos casos), e como o desemprego está sempre batendo à porta dos homens (graças, é claro, ao próprio governo), nego baixa a cabeça. Ou seja, o Bolsa Família é uma arma contra o “patriarcado” e contra o “machismo”.

Essa gente à sinistra é muito esperta mesmo…

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Faça amigos até os trinta e tantos anos de vida; depois, após longo afastamento, aguarde a morte para revê-los no Céu ou no Inferno.

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Em espanhol, “heder’ significa “feder”, e “hediondo”, “fedido”. Ou seja: todo mundo já sabia que um corrupto é hediondo, os senadores não precisavam colocar isso no papel. (Alguém imagina que Lula seja cheiroso? Ou Sarney? Ou Collor?)

Aliás, segundo Swedenborg, quando um corrupto é levado do Inferno para o Céu como visitante, ele, assim que lá chega, começa a implorar que o levem de volta, pois,no Céu, a verdade se manifesta e ele não consegue suportar o próprio cheiro, acreditando que o Céu é que está fedendo — e então, devido à ignorância, perpetua sua estada nas sociedades infernais, onde as verdades se escondem.

Nós outros, sabedores do problema, tomaremos um banho no Purgatório antes de seguir viagem…

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Estamos em 2013 e você ainda não adquiriu um Kindle, um Kobo ou sequer um Sony Reader — os inventores do papiro e do pergaminho estão lá no Céu de queixo caído, mal podendo crer em tal notícia.

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Quando finalmente ocorreu a Revolução de 1917, a parcela esclarecida da população russa foi pega de surpresa, afinal, esse tal de socialismo era apenas uma conversa fiada dos anos 1840 e 1850. (Sabe, né? Coisa velha em que ninguém mais acredita…)

Se os russos, que respeitavam a literatura, não ouviram Dostoiévski, quantos brasileiros, que desprezam o verdadeiro conhecimento, irão ouvir um filósofo?

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Meu coração, cujo ritmo não é alterado pela seleção brasileira desde 1990, é tão futebolisticamente neutro que eu poderia ser árbitro de um jogo do Brasil. Seria divertido, nego me xingando de traidor para baixo e me ameaçando por causa de uma arbitragem super correta. B^)

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— Gostou do meu batom vinho?
— Hmm, sua maquiadavélica…

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Tarantino, quanto você cobraria para ser DJ numa festa lá em casa?
— Fuck you, you motherfucker!!

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Na verdade — quem poderá negá-lo? — o fígado do Lou Reed foi extremamente tolerante.

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Dominique Venner, que se suicidou ontem na catedral de Notre-Dame, deve ter morrido em vão: somente os islâmicos admiram mártires suicidas.

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A maioria das discussões filosóficas, religiosas e políticas da internet não passa de logomaquia.

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No Houaiss:

logomaquia Datação: 1858

n substantivo feminino
1 discussão gerada por interpretações diferentes do sentido de uma palavra; querela em torno de palavras
2 Derivação: por extensão de sentido.
emprego de termos não definidos num discurso, numa argumentação; palavreado vão
3 Uso: pejorativo.
querela em torno de coisas insignificantes

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Somente um hacker poderia levar a cabo uma efetiva Desobediência Civil: meter um trojan no sistema da Receita Federal que devolvesse a grana dos impostos e tributos diretamente para as contas bancárias dos contribuintes — voilà!

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Aquele cuja fé não repousa senão na imanência e que, mesmo assim, ainda não chegou ao solipsismo, sofre ou de falta de imaginação ou de preguiça de pensar — ou de ambas.

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Esse negócio de acesso biométrico aos caixas eletrônicos significa duas coisas: mais seqüestros relâmpagos e (novidade) ladrões de dedo.

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Verificar os caminhos sem blitz na volta para casa após a balada ainda é a razão mais convincente para se adquirir um smartphone.

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Algumas etnias indígenas acreditavam que a fotografia poderia roubar a alma do fotografado e, com o Facebook, passaram a ter certeza disso.

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Na CNN: nos EUA, ao longo de dez anos três irmãos de nome Castro mantiveram em cativeiro três mulheres — mais cinqüenta anos e teriam igualado o cativeiro imposto a toda uma população pelos irmãos Castro de Cuba.

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Saudade, essa força de gravidade do amor.

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Brazilian Wax → depilação completa dos pelos púbicos que deixa sua genitália lisinha;
Brazilian Tax → depenação completa por parte do poder público que deixa seu bolso lisinho.

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Receita de pavê nerd: quebre ao meio rosquinhas Mabel e coloque-as numa tigela; cubra-as com iogurte do seu sabor predileto; deixe a tigela 1 hora no congelador. Sirva-a para si mesmo enquanto assiste ao The Big Bang Theory.

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Sonhos lúcidos são dez mil vezes melhores que o melhor vídeo game.

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Obviamente, a retirada de cruzes das repartições públicas faz parte do plano de dominação dos vampiros.

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Devia rolar um corredor polonês para os mensaleiros. (Infelizmente, com tantos brasileiros comprados por esmolas oficiais, teríamos de importar os poloneses.)

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— Sabe por que é ruim ser um solteirão? — pergunta ela.
— Por quê?
— Você morre mais cedo…
— Que ótimo! Então não precisarei me suicidar.

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Dizem que Deus é para losers. “Ah, fulano sifu e aí virou crente.” Mas não fracassaremos todos no final? O que é a morte senão o fracasso do corpo?

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Não sei qual ator conseguiu ser mais insuportável: se Cary Grant em His Girl Friday (1940), ou se Tom Ewell em The Seven Year Itch (1955).

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Espero que Dante Alighieri esteja certo e o Inferno seja mesmo uma espécie de zoológico aberto à visitação: caso não lhes seja concedida a Graça, será legal ir dar pipoca para Lula & Cia. E também para esses meninos que matam gente como gente grande. E para pilotos remotos de drone. E para… Puts, a lista é muito grande. Deixa pra lá.

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“De perto, ninguém é normal.” Certo, mas se permitirmos que a norma seja destruída, como saberemos o que é “perto”? Ninguém mais saberá qual é a distância segura e todos pisarão nos calos uns dos outros.

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Segundo Edgar Allan Poe, as quatro condições elementares da felicidade são: a vida ao ar livre; o amor de uma mulher; o desapego a toda ambição; e a criação de uma nova beleza.

No entanto…

« A verdade parece ser que o gênio da mais alta categoria vive num estado de perpétua hesitação entre a ambição e o desprezo por ela.»
Edgar Allan Poe

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O Brasil é um mindfuck.

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Seja ou não um escritor, a vida é sempre você diante do papel em branco.

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Fonte: Meu FB.

Um papo com Paulo Briguet ─ Giovanni Nobile

Paulo Briguet

Um papo com Paulo Briguet

por Giovanni Nobile

06 de Maio de 2013 - 19:56 hs
O Blog do Giovanni, além de poesias, contos, crônicas e pequenas matérias, também traz algumas entrevistas. A partir de maio, de tempo em tempo uma entrevista com algum escritor, editor, produtor cultural, poderá aparecer por aqui. E a conversa de hoje é o jornalista Paulo Briguet, colunista aqui do Jornal de Londrina. Ele se formou em 1993, mas ainda antes já trabalhava em redações. Mas a conversa de hoje deixa um pouco o jornalista de lado – se é que é possível – para um papo exclusivo do Blog do Giovanni com o cronista Paulo Briguet:

Qual seu interesse pelo gênero das crônicas?
Desde criança eu gostava das crônicas e poemas da Cecília Meireles na cartilha escolar. Depois fui descobrindo outros cronistas: Paulo Mendes Campos, Luis Fernando Verissimo (no tempo em que ele era engraçado), Nelson Rodrigues, José Carlos Oliveira, Rubem Braga. Aí vi que também existem cronistas não-brasileiros: Chesterton e Dino Buzzati são ótimos exemplos. Acho que aprendi a fazer crônicas antes de aprender a escrever, ouvindo as conversas de meus pais e avós e as histórias da coleção Disquinho, os vendo seriados de ficção científica na TV.

Aliás, para você, o que é crônica?
Defino crônica como texto curto com temática do cotidiano, livre da obrigação de contar uma história, com uma pitada de humor e ironia, às vezes poesia. Todos os meus escritos são crônicas disfarçadas, mesmo quando parecem contos, reportagens, peças publicitárias, panfletos políticos ou cartas de amor.

Há espaço para a crônica na cultura da velocidade do consumo de informação atualmente? Como vê o espaço da crônica no jornal?
Sim. Felipe Moura Brasil (do excelente Blog do PIM) é um exemplo. Gustavo Nogy (do blog Ad Hominem), outro. Também gosto de Yuri Vieira. Júlio Tanga (do blog Falta de Enxada) ainda será reconhecido como o gênio que é, embora ele seja mais um contista do que um cronista. Sobre a crônica no jornal, ela continua viva e passa bem, obrigado. Sou o segundo melhor cronista do meu jornal. (Só temos dois cronistas, eu e meu amigo Domingos Pellegrini, que não é propriamente um autor de crônicas, mas de vez em quando acerta a mão maravilhosamente.)

E mais: qual o papel do próprio jornal impresso atualmente?
O papel do jornal impresso é fazer oposição à hegemonia política que se pretende instaurar no Brasil.

Nesse sentido, você compara o meio impresso com o online ao escrever? Quero dizer: quando escreve para o impresso, escreve de uma forma; e quando escreve para o online, pensa de outra maneira? Ou o suporte para seus textos é indiferente, na sua visão?

Quando eu mantinha um blog no Tipos (portal hoje extinto), escrevia em linguagens completamente diferentes para o on-line e para o impresso. Agora isso acabou. Escrevo do mesmo jeito. E acho que deve ser assim mesmo. Sou um só.

Considera algum suporte mais importante?
Os dois são importantes porque atingem públicos distintos. Tenho sete leitores no JL impresso e sete leitores no blog do JL. Já são quatorze! Agora vai!

E quando as crônicas ultrapassam o prazo de validade do texto de jornal e migram para os livros, ganhando, digamos, “eternidade”: qual o espaço atual da crônica no mercado editorial, na sua visão?
O espaço para as crônicas existe e sempre existirá, mas elas devem passar por um “tratamento” (uma edição especial) antes de migrar para as páginas do livro. É preciso eliminar pequenos erros e informações datadas que tornariam o texto incompreensível.

É esta a visão que você tem também quando se fala de novos autores? E, ainda, quando se tratam de novos autores regionais…
Já citei bons novos autores: Felipe Moura Brasil, Gustavo Nogy, Yuri Vieira, Júlio Tanga. Mas também gosto de Luiz Felipe Pondé, João Pereira Coutinho, André Simões (olho nesse rapaz, André Simões: é excepcional).

Quais as dificuldades que um autor, seja novo ou não, encontra no mercado editorial, na sua visão? E há facilidades?
Acho que as dificuldades são as de sempre, mas hoje em dia é muito mais fácil imprimir e editar um livro por conta própria.

Quais suas preferências? (Gênero, autores e até mesmo alguns títulos que possa sugerir).
Já citei os cronistas. Para não fazer uma lista exaustiva, vou indicar quatro russos (Tolstói, Dostoiévski, Turguêniev, Tchekhov), quatro americanos (Saul Bellow, Bernard Malamud, Philip Roth, John Updike), cinco poetas universais (Camões, Eliot, Yeats, Herberto Helder e Cecília Meireles) e Santo Agostinho.

Você acompanha a literatura londrinense? Qual sua visão dela em comparação com a literatura comtemporânea brasileira?
Acompanho muito pouco. Temos Domingos Pellegrini, autor de “Terra Vermelha”, um grande livro. Rodrigo Garcia Lopes disse que acabou de escrever um romance. Vou ler e depois conto.

O que poderia melhorar na literatura londrinense?
Não faço a mínima ideia, Giovanni. Não tenho a mínima noção de política cultural. Para falar a verdade, tenho até repugnância do termo. Acho que os escritores devem escrever em vez de promover a literatura.

Você sempre brinca sobre seus 7 leitores… Quantos livros já vendeu? 7?!
Vendi uns 250 deste último, “Aos meus sete leitores”. Dos outros dois eu nem lembro. Sou um autor muito obscuro e desconhecido. Mas digo isso sem rancor. Descobri que não sou gênio, nem mesmo talentoso. Estou na fronteira entre o medíocre e o mediano. O problema é que não sei fazer outra coisa na vida.

Qual foi o de maior tiragem?
Esse último, independente, teve mil exemplares. Ou seja, tenho 750 livros encalhados na minha casa e na casa da minha sogra.

Há planos para nova publicação?
Um romance político e outro livro, difícil de enquadrar numa categoria. Será uma mistura de crônicas e memórias familiares, que vou escrever para o meu filho contando a história de seus antepassados.

Já pensou em publicar em outros meios (CD, vídeos em youtube, etc).
Andei recitando uns poemas em vídeos no Facebook, com resultados patéticos.

Algo que não perguntei e que gostaria de acrescentar?
Quando vamos tomar uma cerveja?

(Para esta última resposta-pergunta, ainda não há data definida).

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Fonte: Jornal de Londrina. (Cache do Google.)

Dostoiévski (Достоевский, 2010) – seriado em 8 partes

Sim, uma cinebiografia de Fiódor Dostoiévski. No início do primeiro episódio, há uma montagem paralela na qual o grande escritor russo — enquanto posa para seu famoso retrato — relembra sua “quase execução”, a mesma “pegadinha do Czar” narrada pelo príncipe Míchkin no romance O Idiota. Ninguém precisa entender russo para apreciar a seqüência…

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Agora, cá entre nós: alguém podia nos fazer o favor de traduzir esse seriado, não é? Não consegui encontrar sequer legendas em inglês. Aliás, nem o IMDB parece conhecer a existência da produção. Por enquanto, a única saída é checar a página do seriado neste site russo e, mediante a tradução da Google (no meu caso, claro), ler algumas resenhas a respeito.

William Blake e a Imaginação Humana

Angel of Revelation, by William Blake

« Trêmulo permaneço dia e noite, meus amigos se espantam.
Mas perdoam o meu divagar, pois não descanso de minha grande tarefa!
Abrir os Mundos Eternos, abrir do Homem
Os Olhos Imortais aos Mundos do Pensamento: à Eternidade
Em contínua expansão no Seio de Deus, a Imaginação Humana.
Oh, Salvador, verte sobre mim teu Espírito de mansidão e amor:
Aniquila em mim o Egoísmo, sê toda a minha vida!»

William Blake, De Jerusalém – Invocação: Capítulo I

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« Trembling I sit day and night, my friends are astonish’d at me.
Yet they forgive my wanderings, I rest not from my great task!
To open the Eternal Worlds, to open the immortal Eyes
Of Man inwards into the Worlds of Thought: into Eternity
Ever expanding in the Bosom of God, the Human Imagination
O Saviour pour upon me thy Spirit of meekness & love:
Annihilate the Selfhood in me, be thou all my life!»

William Blake, From Jerusalem – Invocation: Chapter I

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