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Do romance Eumeswil (1977), de Ernst Jünger, 454 páginas:
« Onde a vida se apresenta sem véus, como na nudez, no rapto e nos antigos sacrifícios, paga-se em sangue e ouro. Que o ouro é melhor, o homem sabe e a mulher melhor ainda; e este saber sobreviverá aos Estados, por muitos que sejam os que desmoronem ou floresçam.
« Tirar o ouro dos indivíduos, negar-lhes o direito a ele, eis o que tentam os Estados, enquanto o indivíduo procura escondê-lo de suas vistas. Querem “o melhor para ele”… por isso lhe tiram seu ouro e o armazenam em cofres e pagam com papel, cujo valor diminui a cada dia.
« Quanto mais domesticado é o homem, mais se deixa enganar por qualquer mentira. Mas o ouro é digno de fé. Tem seu valor em si, nele não há engodo. Esta realidade é patente entre nós; é uma das vantagens de Eumeswil.»
(…)
« Permito-me repetir que prefiro a história da cultura à dos Estados. Com aquela começa e acaba a humanidade. Portanto, concedo também maior importância à história da corte, inclusive seus amores e intrigas do que à história política e dos partidos. A história é feita pelos homens e, no máximo, regulada pelas leis; daí sua inesgotável capacidade de surpresas.»
(…)
« O cuidado com que o Domo utiliza a linguagem contrasta de modo estranho com o desalinho costumeiro em Eumeswil. Só se escutam frases desgastadas, de contornos imprecisos como as moedas do mendigo — e, naturalmente, mais nos lábios de universitários que no porto e no mercado. Nem sempre foi assim: os camponeses, os artesãos, os caçadores, os soldados, os velhacos sempre souberam utilizar imagens fortes.
« A “popularização” acabou com tudo isto. Para tanto contribuíram eumenistas do talento de um Sperling e um Kessmuller. O objetivo era acabar com a linguagem elevada. “O estilo é o homem”… era preciso acabar com isto; era preciso impedir que se reconhecesse a classe espiritual de um homem pelo seu modo de falar. Surgiu aqui uma vulgarização da linguagem, que já não era própria nem dos de cima nem dos de baixo.
« Na verdade, nem todos os cálculos deram certo. Inclusive nas épocas em que desaparecem os bons marceneiros, um bom armário ou um simples tabuleiro bem-feito se destacam do resto. Igualmente, quando as elites são raras ou estão reduzidas a indivíduos isolados, as palavras claras, precisas, sólidas convencem o homem sem cultura — precisamente este, o não-deformado pela cultura. Ele pressente — e isto o tranqüiliza — que o poderoso, apesar de sua força, reconhece regras e leis. Caesar non supra grammaticos. Um consolo para épocas decadentes.»
(…)
« A tortura do historiador e sua transformação em anarca vem da convicção de que não se pode eliminar o cadáver e que sempre haverá novos enxames de abutres e moscas pressurosos ao seu redor… isto é, o pensamento de que, consideradas as coisas em seu conjunto, o mundo é imperfeito e deve ter havido desde o princípio algum erro de planejamento.»
(…)
« Rosner é um materialista da mais pura cepa e, como tal, inteligente demais para ser darwinista. Poderia ser considerado seguidor de certos neovitalitas.»
(…)
« O contemporâneo só tem capacidade para configurar fatos. É contado como voto, como contribuinte e assalariado, como espécie que sobrevive nos arquivos dos registros civis e nos ministérios. Sua memória desce à sepultura junto com seus netos.
« A capacidade de configurar anedotas é mais poderosa, é fecunda em história. Nela se condensa o gênero com seus caracteres próprios; fixa-se durante séculos. Pelo cristal se conhece uma montanha e, pela moeda, um metal. Aqui não existe um privilégio de papas e imperadores: um monge, um camponês, um bufão podem fazê-lo com maior eficácia.
« A capacidade de configurar mitos é, em contrapartida, a-histórica, não está submetida a uma origem e uma evolução; repercute de maneira incalculável e imprevisível sobre a história. Não pertence ao tempo, e sim o cria.
« É por isso que em épocas de declínio em que a substância histórica está esgotada e já nem sequer consegue garantir a ordem zoológica da espécie, sempre se lhe viu indissoluvelmente acoplada uma expectativa surda e inexpressa. A teologia desaparece sob a areia, cede lugar à teognose: já não se quer saber nada mais sobre os deuses; quer-se vê-los.»
(…)
« Em todo caso, o primeiro Estado Mundial teria sido inimaginável sem a repercussão niveladora da técnica, e mais concretamente da eletrônica… também poderia dizer-se (mais uma vez como Bruno) que “foi subproduto”. Vigo, que tem pela técnica uma antipatia visceral, concorda plenamente.»
(…)
« O tirano será substituído pelo demagogo. O demagogo conduz o timão através do sistema de realizar plebiscitos quando bem lhe aprouver. A arte está no modo de formular a pergunta; se este ponto for bem resolvido, a resposta será esmagadoramente afirmativa, não só em virtude do número, como também em virtude da uniformização espiritual, que chegará até as elites.»
(…)
« …escrever será um ato de, digamos, caridade, para consolar o ser humano de ser o que é? Ou escrever não tem sentido?»
« …a anedota que Paulo Mendes Campos me contou: um ser perfeito, lindíssimo, civilizadíssimo, desceu de um disco voador e o terráqueo, embasbacado, pergunta: “ah, vocês evoluíram assim foi depois do caos, é?” “É”, respondeu o outro, “surgiu lá no nosso planeta um homem chamado Jesus, que pregava o amor ao próximo e até aos inimigos”. O habitante da Terra observou: “é, aqui também, e nós o crucificamos”. O extraterrestre achou inacreditável: “cru-ci-fi-ca-ram?!” Pois no planeta dele tinham seguido Jesus e por isso tinham se tornado perfeitos todos os habitantes de lá…»
« Sinto que nós estamos naquela região das trevas, no vértice supremo das trevas, da maldade, da ignorância que o hinduísmo chama de Kali yuga. Acho que nos estamos aproximando celeremente de um desfecho apavorante, sem retorno.»
« Uma pessoa que tiver essa hiperlucidez de se compreender livre em um mundo esquizofrênico poderá sobreviver a essa iluminação interior ameaçadora?»
« Me parece que Deus não é omnipotente. Acho que Ele está irremediável e definitivamente sozinho. Deus está na escuridão, o próprio Deus luta, procura, quer que alguém Lhe estenda a mão, O ajude.»
Hilda Hilst (1930 – 2004), durante uma entrevista.
(Infelizmente, em meu bloco de anotações não consta a fonte.)
« Em todas as épocas, existem duas literaturas que caminham lado a lado e com muitas diferenças entre si: uma real e outra aparente. A primeira cresce até se tornar uma literatura permanente. Exercida por pessoas que vivem para a ciência ou para a poesia, ela segue seu caminho com seriedade e tranqüilidade, mas manifesta-se com lentidão, produzindo na Europa pouco menos de uma dúzia de obras por século, que, no entanto, permanecem. A outra, exercida por pessoas que vivem da ciência ou da poesia, anda a galope, com rumor e alarido por parte dos interessados, trazendo anualmente milhares de obras ao mercado. Após poucos anos, porém, as pessoas perguntam: Onde estão essas obras? Onde está sua glória tão prematura e ruidosa? Por isso, pode-se também chamar esta última de literatura que passa, e aquela, de literatura que fica.»
Arthur Schopenhauer, Da leitura e dos livros (in Sobre o ofício do escritor).
« Uma das paixões mais vazias do homem moderno é ler jornais para ficar a par das últimas notícias. As notícias são sempre ruins e envenenam sua vida, mas o homem moderno não pode viver sem este veneno. Ele precisa saber de todos os assassinatos, de todas as curras. Precisa saber de todas as loucuras e falsas teorias. O jornal não lhe basta. Ele busca notícias adicionais no rádio e na televisão. As revistas são publicadas com a soma de todas as notícias da semana e as pessoas relêem que crime este ou aquele malfeitor cometeu e o que cada idiota disse. A loucura da política apanhou até a nossa chamada ortodoxia. E quanto à paixão por dinheiro! Se você ler a imprensa ortodoxa, vai tomar conhecimento de uma única mensagem em todo artigo e reportagem: “Doe dinheiro!”. Eles precisam de intermináveis quantias de dinheiro para construir yeshivas [escola para formação de rabinos], para manter — como colocam eles — o judaísmo. É uma mentira completa. As grandes yeshivas, as brilhantes salas de aula, a boa comida, os exames — tudo isto é pantomima. Já existem colégios ortodoxos ou universidades na América que ensinam à juventude um pouco da Torá e muito goyishkeit [em iídiche, goy (não-judaico) e ishkeit (modo de ser)]. Os estudantes estão, supostamente, sendo treinados para se adaptar a ambos, mundanismo e Deus. O fato é que uma vez que você está ajustado ao mundo não pode mais estar ajustado a Deus. Aquelas crianças balbuciam em hebraico moderno, com sua pronúncia sefardita, e lerão, cedo ou tarde, todos os livros imundos que são traduzidos aqui. O hebraico deve permanecer uma língua sagrada, não uma linguagem usada em clubes noturnos.
« Eu dissera àquela devassa, Priscilla, que o Deus judeu era um “ídolo” para mim. Talvez quisesse dizer isso na época. A fé não é uma coisa fácil de conquistar. Bem depois que me tornei um judeu com barba e madeixas, ainda necessitava de fé. Mas a fé, gradualmente, cresceu dentro de mim. As ações devem vir primeiro. Bem antes de a criança saber que tem um estômago, quer comer. Bem antes de você alcançar a fé total, deve agir de um jeito judeu. O judaísmo leva à fé. Sei agora que existe um Deus. Creio em Sua Providência. Todas as vezes que me aflijo ou uma das minhas crianças fica doente, rezo ao Todo-Poderoso.
« Não quero me vangloriar de que minha fé seja absoluta. Talvez não exista esta coisa de fé total. Mas acredito mais hoje do que jamais acreditei antes. Darwin e Karl Marx não revelaram o segredo do mundo. De todas as teorias sobre a criação, a exposta no Gênesis é a mais inteligente. Tossa essa conversa sobre névoas primitivas ou a Grande Explosão é um violento disparate. Se alguém encontrasse um relógio numa ilha e dissesse que ele se fez por si mesmo ou que se desenvolveu através da evolução, seria considerado um lunático. Mas, conforme a ciência moderna, o universo evoluiu todo por sua conta. ¿O universo é menos complicado que um relógio?
« Sei o que você quer me perguntar — se ainda estou interessado em sexo. Creia-me, uma mulher pura, decente, pode proporcionar a um homem mais satisfação física do que todas as prostitutas refinadas do mundo. Quando um homem dorme com uma mulher moderna, ele realmente vai para a cama com todos os seus amantes. Eis por que há tantos homossexuais hoje, porque o homem moderno está dormindo espiritualmente com incontáveis outros homens. Ele constantemente quer se sobressair no sexo porque sabe que sua parceira o está comparando com os outros. Esta é também a causa da impotência, da qual tantos sofrem. Eles transformaram o sexo num mercado com competidores. O homem de hoje precisa se convencer de que ele é o maior amante e que, em comparação, Casanova era um garoto de escola. Ele também tenta convencer a mulher, mas ela sabe mais.
« A mulher está na mesma posição. Sabe que seu marido tem e teve muitas outras mulheres e quer competir com elas, ser mais esperta e mais bonita do que elas são. O homem moderno injetou competição em áreas a que ela não pertence. Toda vida moderna é uma série de provas para determinar quem é o mais alto, o maior, o mais forte; quem é capaz de atuar melhor que os outros. A mulher de hoje anseia ser a mais bela criatura sobre a Terra.
« Entre aqueles judeus com os quais vivo, não existe nenhuma pessoa grande ou pequena. Um homem passa mais tempo com a Torá; outro, recitando salmos. Um tem mais tempo para estudar, outro deve trabalhar para viver. Ninguém se compara, ninguém se mede em relação aos outros e o ponto principal é que não há nenhuma busca de lucro. Eles se libertam da pior paixão humana — a necessidade de ser rico.
« Eu seria mentiroso se lhe dissesse que tudo é suavidade e luz entre nós. Aqui também há pessoas más. O Espírito do Mal não foi liquidado. Mesmo quando sento e estudo o Gemara, tenho pensamentos fúteis que caberiam mais a um beduíno. Um momento não passa sem tentações. Satã está constantemente no ataque. Ele nunca fica cansado. Mas liguei-me ao judaísmo com laços que são difíceis de cortar. Estes laços são minha barba, minhas madeixas, minhas crianças e, agora, minha idade também.
« Às vezes o Mal me diz: “O que acontecerá, Joseph Shapiro, se você morrer e não houver nada depois daqui? Você será uma pilha de sujeira, cego, mudo, uma pedra, uma bolha de lama”. Eu o escuto e respondo: “Minha mortalidade não provaria que Deus está morto e que o universo é um acidente físico ou químico. Vejo um plano e uma intenção consciente em todo ser, no homem e nos animais, bem como nos objetos inanimados. A graça de Deus muitas vezes está escondida, mas sua ilimitada sabedoria é vista por todos, mesmo que o chamem de natureza, substância, absoluto ou qualquer outro nome. Creio em Deus, na Sua Providência e na livre determinação do homem. Aceitei a Torá e seus comentários porque tenho certeza de que não existe nenhuma escolha melhor. Esta fé continua crescendo o tempo todo dentro de mim”.»
O Penitente (1983), de Isaac Bashevis Singer, 143 páginas.
« Aceito com entusiasmo o lema "O melhor governo é o que menos governa"; e gostaria que ele fosse aplicado mais rápida e sistematicamente.»
(…)
« Há seis anos que não pago o imposto per capita. Fui encarcerado certa vez por causa disso, e passei uma noite preso; enquanto o tempo passava, fui observando as paredes de pedra sólida com dois ou três pés de espessura, a porta de madeira e ferro com um pé de espessura e as grades de ferro que dificultam a entrada da luz, e não pude deixar de perceber a idiotice de uma instituição que me tratava como se eu fosse apenas carne e sangue e ossos a serem trancafiados. Fiquei especulando que ela devia ter concluído, finalmente, que aquela era a melhor forma de me usar e, também, que ela jamais cogitara de se aproveitar dos meus serviços de alguma outra maneira. Vi que apesar da grossa parede de pedra entre mim e os meus concidadãos, eles tinham uma muralha muito mais difícil de vencer antes de conseguirem ser tão livres quanto eu. Nem por um momento me senti confinado, e as paredes pareceram-me um desperdício descomunal de pedras e argamassa. O meu sentimento era de que eu tinha sido o único dos meus concidadãos a pagar o imposto. Estava claro que eles não sabiam como lidar comigo e que se comportavam como pessoas pouco educadas. Havia um erro crasso em cada ameaça e em cada saudação, pois eles pensavam que o meu maior desejo era o de estar do outro lado daquela parede de pedra. Não pude deixar de sorrir perante os cuidados com que fecharam a porta e trancaram as minhas reflexões – que os acompanhavam porta afora sem delongas ou dificuldade; e o perigo estava de fato contido nelas. Como eu estava fora do seu alcance, resolveram punir o meu corpo; agiram como meninos incapazes de enfrentar uma pessoa de quem sentem raiva e que então dão um chute no cachorro do seu desafeto. Percebi que o Estado era um idiota, tímido como uma solteirona às voltas com a sua prataria, incapaz de distinguir os seus amigos dos inimigos; perdi todo o respeito que ainda tinha por ele e passei a considerá-lo apenas lamentável.
« Portanto, o Estado nunca confronta intencionalmente o sentimento intelectual ou moral de um homem, mas apenas o seu corpo, os seus sentidos. Ele não é dotado de gênio superior ou de honestidade, apenas de mais força física. Eu não nasci para ser coagido. Quero respirar da forma que eu mesmo escolher. Veremos quem é mais forte. Que força tem uma multidão? Os únicos que podem me coagir são os que obedecem a uma lei mais alta do que a minha. Eles obrigam-me a ser como eles. Nunca ouvi falar de homens que tenham sido obrigados por multidões a viver desta ou daquela forma. Que tipo de vida seria essa? Quando defronto um governo que me diz "A bolsa ou a vida!", por que deveria apressar-me em lhe entregar o meu dinheiro? Ele talvez esteja passando por um grande aperto, sem saber o que fazer. Não posso ajudá-lo. Ele deve cuidar de si mesmo; deve agir como eu ajo. Não vale a pena choramingar sobre o assunto. Não sou individualmente responsável pelo bom funcionamento da máquina da sociedade. Não sou o filho do maquinista. No meu modo de ver quando sementes de carvalho e de castanheira caem lado a lado, uma delas não se retrai para dar vez à outra; pelo contrário, cada uma segue as suas próprias leis, e brotam, crescem e florescem da melhor maneira possível, até que uma por acaso acaba superando e destruindo a outra. Se uma planta não pode viver de acordo com a sua natureza, então ela morre; o mesmo acontece com um homem.»
A Desobediência Civil, de Henry David Thoreau.
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« O esforço de escrever um conto curto é tão intenso como o de começar um romance. Pois no primeiro parágrafo de um romance é preciso definir tudo: estrutura, tom, estilo, longitude, e às vezes até o caráter de algum personagem. O resto é o prazer de escrever, o mais íntimo e solitário que se possa imaginar, e se a gente não fica corrigindo o livro pelo resto da vida é porque o mesmo rigor de ferro, que faz falta para começá-lo, se impõe na hora de terminá-lo. O conto, por sua vez, não tem princípio nem fim: anda ou desanda. E se desanda, a experiência própria e a alheia ensinam que, na maioria das vezes, é mais saudável começá-lo de novo por outro caminho, ou jogá-lo no lixo.»
(…)
« Sempre acreditei que toda versão de um conto é melhor que a anterior. ¿Como saber então qual deve ser a última? É um segredo do ofício que não obedece às leis da inteligência mas à magia dos instintos, como a cozinheira que sabe quando a sopa está no ponto.»
(…)
« Às vezes me sentia escrevendo pelo puro prazer de narrar, que é talvez o estado humano que mais se parece à levitação.»
Obs.: Trechos de uma entrevista retirados de um dos meus velhos blocos de anotações que, como já disse em outros posts, também nesse caso, infelizmente, não traz indicações de fonte.
Curiosidade: Bruno Tolentino, que conheceu García Márquez pessoalmente, me disse que foi praticamente impossível ter um diálogo sério com ele, haja vista os vários baseados que ele, Márquez, não parava de fumar…