palavras aos homens e mulheres da Madrugada

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Georges Simenon fala sobre isolamento e simpatia pelo personagem

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« Um deles, por exemplo, que me perseguirá mais que qualquer outro, é o problema da comunicação. Quero dizer, comunicação entre duas pessoas. O fato de que somos não sei quantos milhões de pessoas, e de que, não obstante, a comunicação, comunicação completa, é inteiramente impossível entre duas dessas pessoas, é para mim um dos maiores e mais trágicos temas do mundo. Quando eu era menino, isso me causava medo. Eu quase chegava a gritar. Dava-me uma sensação de isolamento, de solidão. Eis aí um tema que abordei não sei quantas vezes. Mas sei que retornará. Retornará, certamente.»

(…)

« Mas não se trata apenas da questão de o artista perscrutar seu próprio íntimo, mas, também, o dos outros, com a experiência que tem de si próprio. Ele escreve com simpatia porque sente que o seu semelhante é como ele.»

Georges Simenon

Trecho de uma entrevista à Paris Review, que encontrei em um dos meus blocos de anotações.

William Faulkner fala sobre a arte literária

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« Sou um poeta fracassado. Talvez todo romancista deseje escrever antes poesia, verifique que não é capaz, e tente, então, o conto, que é a forma literária que mais exige depois da poesia. E, malogrando nisso, somente então se dedique a escrever romances.»

(…)

« [Como ser um romancista?] Noventa e cinco por cento, talento… Noventa e nove por cento, disciplina… Noventa e nove por cento, trabalho. Não deve jamais ficar satisfeito com o que faz. Jamais a coisa é tão boa como pode ser feita. Sempre sonhe e aspire a mais do que aquilo que sabe que pode fazer. Não se preocupe em ser melhor que seus contemporâneos ou antecessores. Procure ser melhor do que você mesmo. Um artista é uma criatura impelida por demônios. Não sabe por que razão eles o escolheram, e se acha habitualmente demasiado ocupado para perguntar a si próprio por que o fizeram.»

(…)

« A qualidade que um artista deve possuir é objetividade para julgar seu trabalho, além da honestidade e da coragem de não enganar a si próprio a respeito dele.»

(…)

« Um escritor precisa de três coisasexperiência, observação e imaginação — duas das quais e, às vezes, qualquer uma delas, podem suprir a falta das demais. Comigo, em geral, a história começa com uma simples idéia, uma lembrança ou uma imagem mental. A redação da história é simplesmente uma questão de prosseguir até esse momento, explicar por que o fato ocorreu e qual foi a causa que o motivou. Um escritor procura sempre criar criaturas verossímeis, em situações tocantes e críveis, da maneira mais viva que lhe seja possível. Evidentemente, deve ele usar, como uma de suas ferramentas, o ambiente que conhece. Eu diria que a música é o meio mais fácil de expressão, já que chegou primeiro à experiência e à história do homem. Como o meu talento consiste em palavras, devo procurar exprimir canhestramente por meio delas o que a pura música teria feito melhor. Isto é, a música tê-lo-ia exprimido melhor e da maneira mais simples, mas eu prefiro usar palavras, assim como prefiro antes ler que ouvir. Prefiro o silêncio ao som — e a imagem produzida por palavras ocorre em silêncio. Isto é, o trovejar e a música da prosa se processam em silêncio.»

(…)

« O escritor não necessita de liberdade econômica. Necessita apenas de lápis e papel. (…) Se ele não for de primeira classe, engana a si próprio dizendo que não dispõe de tempo ou liberdade econômica. A boa arte pode provir de ladrões, contrabandistas ou bookmakers. As pessoas temem, verdadeiramente, descobrir o quanto de adversidade e pobreza podem suportar. Têm medo de descobrir como são rijas. Nada pode destruir o bom escritor. A única coisa que pode modificá-lo é a morte. Não tem tempo de se preocupar com o êxito ou a obtenção de riqueza. O êxito tem algo de feminino e assemelha-se a uma mulher: se a gente se curvar diante de uma mulher, ela monta na gente. De modo que a maneira de se tratar o êxito é mostrando-lhe o peso de nossa mão. Aí, então, talvez ele se lance a nossos pés.»

(…)

« Que o escritor se dedique à cirurgia ou à profissão de pedreiro, se se interessar pela técnica. Não existe meio mecânico algum para se escrever: nenhum atalho. O jovem escritor seria um tolo se seguisse alguma teoria. A gente aprende pelos seus próprios erros; as pessoas só aprendem errando. O bom artista crê que ninguém é suficientemente bom para dar-lhe conselhos. Possui a suprema vaidade. Não importa quanto admire o escritor antigo, quer suplantá-lo.»

(…)

« O objetivo de todo artista é deter o movimento, que é vida, por meios artificiais, e conservá-lo fixo, de modo que, cem anos depois, quando um estranho o fitar, ele se mova novamente, já que é vida. Como o homem é mortal, a única imortalidade possível para ele é deixar atrás de si algo, que seja imortal, já que sempre se moverá. Essa é a maneira de o artista escrever ‘fulano esteve aqui’ no muro final e irrevogável que ele, algum dia, terá de atravessar.»

William Faulkner

Obs.: Retirei os trechos acima de um bloco de anotações meu datado dos anos noventa. É uma tradução, que encontrei na biblioteca da UnB, da entrevista concedida à Paris Review.

Judicioso artista, ¿isso te apraz?

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« És um rei. Vive só.

  Escolhe um caminho livre
  E segue por onde te levar tua mente livre;
  Aperfeiçoa os frutos das idéias que te são caras,
  Sem nada esperar por teus nobres feitos.

  Em ti estão as recompensas.
  De ti és o juiz supremo.
  Ninguém, com mais rigor,
  Julgará tua obra.

  Judicioso artista, ¿isso te apraz? »

  Alexander Pushkin

Henry Miller fala sobre o ato de viajar

Henry Miller

« É considerado muito romântico visitar e passear entre estranhos, bem como comer do seu pão ao pé das figueiras, do outro lado do mundo. Não se pode negar que é de fato romântico viver uma aventura dessas, embora esse romantismo tenha sido muito exagerado por aqueles cujas vidas sedentárias, até o momento da grande aventura, criaram neles uma idéia exorbitante do que viram, um sabor falso da ação e aventura. Marco Pólo de fato viajou e andou entre estranhos; a verdade, porém, é que qualquer pessoa pode fazer a mesma coisa (desde que tenha coragem e disponha de meios de locomoção).

«Viajar é uma forma de indulgência para consigo mesmo. Se a viagem nada acrescentar ao viajante, ao que ele já possui de conhecimentos humanos, ou se ele não conseguir transmitir à imaginação de outras pessoas as belezas e esplendores de lugares remotos deste mundo, então viajar torna-se um ato inútil e pernicioso. A aquisição de novas sabedorias, a capacidade de acumular dentro de si mesmo novos conhecimentos e fatos, só é nobre naqueles poucos que conhecem a alquimia que transforma essa espécie de barro em ouro eterno e divino…

«Somente o viajante que é, dentro de si mesmo, maravilhoso, pode ver, apreciar, absorver e transmitir uma maravilha. Apenas cinco pessoas como essas, em toda a história do mundo, viram maravilhas. As outras viram aves e animais, rios, montanhas e pântanos e todas as coisas desse gênero de que o mundo está cheio. Os cinco viajantes foram Heródoto, Gaspar, Belchior, Baltazar e o próprio Marco Pólo. A beleza de Marco Pólo é que ele criou uma Ásia na imaginação dos europeus…»

Henry Miller

François Mauriac fala sobre a técnica do romancista

Algumas observações de François Mauriac sobre a arte de escrever romances:

François Mauriac

« Todo romancista deve inventar sua própria técnica, eis aí a verdade. Cada romance digno de tal nome é como outro planeta, quer seja grande ou pequeno, com suas próprias leis, assim como possui sua flora e sua fauna. Assim, a técnica de Faulkner é certamente a melhor para pintar o mundo de Faulkner, sendo que o pesadelo de Kafka criou seus próprios mitos, que o tornam comunicável. Benjamin Constant, Stendhal, Eugène Frometin, Jacques Rivière, Radiguet, todos usavam técnicas diferentes, tomavam liberdades diferentes e impunham a si próprios tarefas diferentes. A obra de arte, em si, quer seu título seja Adolphe, Lucien Leuwen, Dominique, Le Diable au Corps, ou À la Recherche du Temps Perdu, é a solução quanto ao problema da técnica.»

* * *

« Minha opinião não mudou. Creio que meus confrades romancistas mais jovens se acham grandemente preocupados com a técnica. Parecem pensar que um bom romance deve seguir certas normas impostas de fora. Na verdade, porém, tal preocupação os tolhe e embaraça em sua criação. O grande romancista não depende de ninguém, exceto de si próprio. Proust não se assemelhava a nenhum de seus antecessores, e não teve, não poderia ter, quaisquer sucessores. O grande romancista quebra o seu molde; só ele pode usá-lo. Balzac criou o romance “balzaquiano”; seu estilo se adaptava apenas a Balzac. Há um laço estreito entre a originalidade de um romancista em geral e a qualidade pessoal de seu estilo. Um estilo emprestado é um mau estilo. Romancistas americanos, de Faulkner a Hemingway, inventaram um estilo que não pode ser transferido a seus adeptos.»

* * *

«(…) A preocupação com tais questões (qual técnica?) constitui um obstáculo para o romance francês. A crise no romance francês, de que tanta gente fala, será solucionada tão pronto nossos jovens escritores consigam libertar-se da idéia ingênua de que Joyce, Kafka e Faulkner são os detentores das tábuas da lei da técnica da literatura de ficção. Estou convencido de que um homem dotado do temperamento real de romancista transcenderá tais tabus, tais normas imaginárias.»

* * *

« Escrevo sempre que me apraz. Durante um período criador, escrevo todos os dias. Um romance não deve ser interrompido. Quando deixo de ser transportado, quando já não sinto como se estivesse recebendo um ditado, paro.»

* * *

« Sinto que o primeiro dever do escritor é ser ele próprio, aceitar suas limitações. O esforço de auto-expressão deveria afetar sua maneira de expressão.»

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John Barth: Fazer amor e contar histórias

John Barth

«Fazer amor e contar histórias, ambos exigem mais do que boa técnica — mas é só da técnica que podemos falar! (…) escrever e ler ou contar e ouvir eram literalmente maneiras de fazer amor. (…) o próprio relacionamento entre o contador e o ouvinte era de natureza erótica. O papel de quem contava, ele achava, sem levar em consideração o seu sexo, era essencialmente masculino e o do ouvinte ou leitor, feminino, e a história era o veículo de seu relacionamento. (…) A narrativa, para resumir (…), era uma relação de amor, não uma violação: seu sucesso dependia do consentimento e da cooperação do leitor, que ela poderia reter ou a qualquer momento retirar; também da sua própria combinação de experiência e talento para o trabalho, e a habilidade do autor em suscitar, manter e satisfazer o seu interesse — uma habilidade da qual dependia sua vida figurativa, tão certamente como a literal, de Scheherazade.»

John Barth, em Quimera

Ditirambos de Dionísio (Fragmento 67)

Friedrich Nietzsche

Joga teu pesar no abismo!

Esquece, Homem! Esquece, Homem!

Divina é a arte do esquecer!

Queres voar,

Queres habitar as alturas:

Joga o que mais te pesa no mar!

Eis o mar — joga-te no mar!

Divina é a arte do esquecer!

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Friedrich Nietzsche

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