Nos meus cinco anos de Brasília – mais especificamente no alojamento da UnB (1992-1997) – aprendi com alguns roomies (entre eles alguns músicos) que uma das coisas interessantes do aprendizado artístico é rastrear as influências e o percurso dos nossos, digamos, mestres. Lembro, por exemplo, do meu espanto ao saber que Jimi Hendrix havia sido guitarrista de Little Richard. (No início, sempre acreditamos que gênios florescem sozinhos.)
Eis outro exemplo interessante. Este é Nat King Cole, um dos ídolos do meu pai:
Nat King Cole também apresentou um programa musical na TV. Neste episódio, divide as atenções com um garoto de 11 anos de idade:
Anos depois, já crescido, e ainda ao piano, o garoto subiu no telhado. Com uma banda chamada The Beatles (ele aparece ao fundo, à esquerda):
Mais tarde, Billy Preston, o ex-garoto prodígio, assumiu o comando de sua carreira:
E ele nos deixou apenas alguns anos após homenagear George Harrison:
Você talvez não acredite, mas eu, sim, creio que ainda irei assistir ao show desses caras em uma das futuras moradas além desta província terráquea. Halleluya!
Eu sempre achei Olívia Palito uma figura chatérrima e muito, muito feia. Aquele desenho animado me irritava, ofendia meu senso estético. Nunca entendia por que Brutos e Popeye brigavam tanto por causa dela. (A única razão plausível é que eram tão feios e chatos quanto ela.) Bem, depois que conheci o impressionante trabalho do artista plástico paraibano Shiko, até a Olívia Palito se tornou uma gata para mim. Sério.
Claro, Shiko vai muito além dessa releitura. Há muita coisa bacana na galeria dele, muita mesmo, que faz a visita valer a pena. (Preciso confessar que gostaria muito que caras com talento deste naipe lessem meu ensaio Tlön, Urântia, Borges, Deus…)
Vale lembrar que tomei conhecimento do seu trabalho há uns dois ou três anos, graças a outro excelente artista paraibano, o músico Chico Correa, para quem Shiko fez os desenhos da animação abaixo.
O CD que tenho da Chico Correa & Electronic Band é um dos mais dançantes dos últimos tempos. Você encontra um link para baixá-lo aqui.)
Conheço alguns galeristas que costumam reclamar da baixíssima procura por obras de arte no mercado brasileiro. Porque, dizem eles, embora a oferta de boas obras seja grande, as vendas são ínfimas. Não duvido. (Quem escreve livros sabe disso muito bem.) No entanto, um deles, em vez de observar com maior atenção as causas do fenômeno, prefere chegar àquele remédio equivocado: “o governo deveria financiar os coitados dos artistas”. Ora, ora. Mais um querendo que a doença tome conta da paciente sociedade…
Deixando de lado questões secundárias como as que afirmam que falta ao povo educação estético-artística – porque o único problema que isso acarretaria seria a compra de obras de arte sofríveis (norte-americanos têm dinheiro, educação e são capazes de comprar as besteiras caríssimas do Damien Hirst) – a verdade é que nós não compramos muitas obras de arte pela mesma razão que não compramos sapatos italianos, vinhos franceses ou uma Jacuzzi, isto é, graças à política econômica do governo nas últimas décadas, a qual impede a formação de poupança. No aspecto econômico, estamos presos à Matrix Keynesiana. É ela que não nos deixa poupar dinheiro, é ela que faz o governo gastar mais do que arrecada, aumentando a dívida pública e a consequente extração de nosso sangue financeiro mediante impostos, taxas e inflação. Querer que o governo dê dinheiro a um setor qualquer da sociedade, ainda que aos “coitados” dos artistas, seria apenas exigir que ele retire dos demais ainda mais dinheiro na forma de tributos. E, quando torna-se impossível poupar dinheiro – são tantos os furinhos no nosso saco de moedas -, fica muito difícil gastar com coisas belas, porque primeiro é preciso forrar o estômago e garantir um teto sobre as cabeças das crianças. Estética? Cultiva-se um vaso de flores – van Gogh sabia melhor do que ninguém que, na pobreza, não há nada mais bonito.
Ok, ok. Então o problema é a teoria econômica de Lord Keynes. Mas, afinal, o que isso quer dizer? Bem, como este é um site de cultura, e não de economia, usarei dois vídeo-clipes premiados de rap (sim, rap!) do site Econ Stories. Assista-os, conheça qual é a batalha ora em vigor, e perceba que há uma saída. (São legendados em português. É preciso clicar em “CC” para ver as legendas.)
Não falarei nada sobre dois filmes, dirigidos por Bob Fosse, que estão entre meus prediletos: All That Jazz e Cabaret. (Se você ainda não os viu, é mulher do padre.) Tampouco farei análises e encherei lingüiças estéticas. Quero apenas mostrar os três vídeos abaixo.
No primeiro, para provar o quanto Bob Fosse estava à frente do seu tempo, ele interpreta o papel da Serpente na adaptação de O Pequeno Príncipe(1974), dirigida por Stanley Donen. Ao mesmo tempo, vemos imagens intercaladas de alguém que, quando adolescente, há de ter se deslumbrado com o mestre coreógrafo…
Sim, Michael Jackson não era senão um ex-pequeno príncipe que jamais se esqueceu de seu mestre Serpente. Não se trata de plágio. Todo criador tem suas fontes de inspiração. (Tal como Jackson, Fosse certamente tinha as suas.)
Abaixo, veja uma seqüência do ótimo filme Sweet Charity, estrelado por Shirley MacLaine, também dirigido por Fosse. ¿Haverá algum coreógrafo vivo dotado simultaneamente de tal senso de ironia e de semelhante técnica?
Não devo ser o único a notar, em algumas cenas, a influência de Toulouse-Lautrec.
Para encerrar, uma excelente brincadeira do VJ Tom Yaz, que editou a seqüência anterior substituindo a trilha original pela música Dancing Now da banda The B-52’s.
E, por favor, não deixe de assistir a All That Jazz.
Cantada por Skip James (1902-1969), a música era assim:
Então, com o andar da carruagem ocidental morro abaixo – Oswald Spengler explica-o -, Beck Hansen, a quem admiro, melhorou a embalagem, tornou o conteúdo nebuloso, deixando-a assim:
Vi este filme pela primeira vez em 1983, aos 12 anos de idade, no primeiro vídeo cassete comprado por meu pai. O namorado da minha irmã mais velha conhecia uma locadora em Moema (bairro de São Paulo), que, na época, só alugava fitas piratas. (E havia alguma que não o fazia?) All That Jazz acabou com a minha vida. Sério. Agora, quase todo o resto é espera.
(Aliás, por falar nas locadoras de outrora, a qualidade da imagem da fita d’O Exorcista indicava que havia sido gravada no inferno. Minha irmã nunca mais se recuperou.)
Aqui, o coreógrafo Joe Gideon apresenta a seus chocados patrocinadores seu novo musical para a Broadway, Air-otica: “Nós o levamos a todos os lugares mas não o fazemos chegar a lugar algum”.
No último final de semana, assisti ao filme Another Earth, que, embora não seja um filme extraordinário, exemplifica como um drama razoável – muito bem dirigido e com ótimos atores – pode tornar-se um bom filme de ficção científica de baixo orçamento. Ou o contrário: como um razoável filme de ficção científica de baixo orçamento pode tornar-se um bom drama. O argumento traz como pano de fundo o paroxismo da velha ideia do duplo: em vez de um outro personagem idêntico ao protagonista, surge no céu um duplo do planeta inteiro, uma Terra contendo os mesmos continentes, as mesmas cidades e, para angústia da população terráquea (aliás, qual seria a população terráquea original?), contendo provavelmente o duplo de cada um de seus habitantes. Mas, enfim, não é disso que quero tratar.
O caso é que, ao comentar a respeito no Twitter, recebi uma mensagem de Natalia Paruz, que participou da trilha sonora do filme. Ela, que toca “serra musical”, executa uma composição de Scott Munson homônima ao filme. (Veja a cena e ouça a música aqui.)
Veja e ouça também, abaixo, Natalia Paruz tocando no metrô de Nova Iorque.
A música tema de Star Trek:
“1905”, de Eyal Bat:
Sem dúvida, a serra musical de Natalia resume da melhor maneira possível o clima do filme.
______ Publicado no Digestivo Cultural.