palavras aos homens e mulheres da Madrugada

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Dante e a Divina Comédia

Trecho do ensaio Dante e a Divina Comédia, de Otto Maria Carpeaux:

Dante Alighieri « A grande maioria dos leitores da Divina Comédia só conhece o “Inferno”; vence as dificuldades das alusões políticas e históricas, que tornam indispensável o comentário, para compreender os grandes episódios que criaram a glória do poema através dos séculos. Uma compreensão tão fragmentária do “Inferno” não sente escrúpulos, fragmentando o poema inteiro: o “Inferno”, sim, seria um reflexo satírico – sátira trágica – do mundo real e por isso acessível à nossa sensibilidade: o “Purgatório” seria, apenas, repetição mais fraca do “Inferno”, e o “Paraíso”, enfim, uma abstração, teologia escolástica em versos; para a grande maioria dos leitores o “Paraíso” não existe.

« Ler assim a Divina Comédia significa trair o poeta. Dante é um dos artistas mais conscientes de todos os tempos; devia saber o que disse quando atribuiu ao poema, além do sentido literal, vários sentidos alegóricos: um ético, um religioso, um político. Ao leitor moderno repugna a interpretação alegórica, levando a artifícios antiartísticos e às vezes absurdos; e ficamos perplexos quando vemos colocado pelo poeta medieval o sentido político acima do sentido religioso. Num poeta medieval, teríamos esperado o contrário. Mas, pensando assim, estaríamos laborando num anacronismo; a nós, que nascemos depois de Maquiavel, a política parece negócio moralmente inferior. Dante pensava de maneira diferente. Para ele, a política era irmã da religião, e ambas, unidas, guiavam o homem para a paz terrestre e a beatitude celeste; daí a inseparabilidade, no pensamento político de Dante, do poder imperial e do poder papal. O que no Céu é religião, na Terra é política; e o Purgatório é a ponte entre a imperfeição humana e a perfeição divina. Visto assim, o sentido literal da Comédia – o libelo contra os vícios do tempo – é a base moral, e portanto indispensável, do poema; os famosos episódios só tem, para o poeta, valor de exemplos, e só a imaginação realista do poeta os transformou em novelas poéticas. Dante é realista, antes de tudo. Todos os críticos salientaram o realismo das comparações e descrições de paisagens imaginárias no “Inferno”; mas não são, de modo algum, imaginárias. O “Inferno” é a paisagem real dos pecados humanos; e porque a força da imaginação humana tem limites, essa paisagem de montanhas, desfiladeiros, rios e florestas subterrâneas é o espelho da paisagem italiana, dos Apeninos e dos Alpes, do Pó e do Arno, iluminada pelo bem observado “era bruno” (ar dourado), quando “lo giorno se n’andava” (o dia findava). E a grande cidade infernal não é outra senão a cidade de Florença, porque –

Godi, Fiorenza, poi Che se’ si grande

Che per maré e per terra batti l’ali,

E per lo ‘nferno tuo nome si spande!

(Inferno, XXVI, 1-3: “Alegra-te, Florença, que és tão grande / que as asas bates por terra e por mar, / e pelo Inferno o teu nome se expande!”)

« O leitor não mude de continente quando “uscimmo a riveder le stelle” (saímos por ali, a rever estrelas).

« Mas aquela limitação da imaginação não existe com respeito ao “Paraíso”; lá o poeta podia construir livremente o seu mundo de religião política e política religiosa; o Céu de Dante não é a fantasia arbitrária de um sonhador, mas um edifício construído segundo as normas sólidas da lógica escolástica, com os elementos de uma doutrina religiosa coerente e de uma doutrina política bem elaborada. Para aceitar esses elementos, nem é preciso a “suspension of disbelief”; porque, de acordo com as regras da lógica moderna, um sistema de idéias não precisa corresponder a qualquer realidade exterior; só precisa não ter contradições interiores. No caso do “Paraíso”, essa coerência é dada pela poesia, que transforma em realidade dentro da alma uma utopia irrealizável neste mundo:

E ‘n la sua volontade è nostra pace”.

(Paraíso, III, 85: “E está na Sua vontade a nossa paz”.) »

(Fonte: Suma Teológica.)

O êxtase de Agostinho e Mônica

 


CAPÍTULO X

O êxtase de Óstia

Estando já próximo o dia em que teria de partir desta vida – que tu, Senhor, conhecias, e nós ignorávamos – sucedeu, creio, por disposição de teus ocultos desígnios – que nos encontrássemos sós, eu e ela, apoiados em uma janela que dava para o jardim interior da casa em que morávamos. Era em Óstia, sobre a foz do Tibre, onde, longe da multidão, depois do cansaço de uma longa viagem, recobrávamos forças para a travessia do mar.

Ali, sozinhos, conversávamos com grande doçura, esquecendo o passado, ocupados apenas no futuro, indagávamos juntos, na presença da Verdade, que és tu, qual seria a vida eterna dos santos, que nem os olhos viram, nem os ouvidos ouviram, nem o coração do homem pode conceber. Abríamos ansiosos os lábios de nosso coração ao jorro celeste de tua fonte – da fonte da vida que está em ti – para que, banhados por ela, pudéssemos de algum modo meditar sobre coisa tão transcendente.

Nossa conversa chegou à conclusão que nenhum prazer dos sentidos carnais, por maior que seja, e por mais brilhante e maior que seja a luz material que o cerca, não parece digno de ser comparado à felicidade daquela vida em ti. Elevando nosso sentimento para mais alto, mais ardentemente em direção ao próprio Ser, percorremos uma a uma todas as coisas corporais, até o próprio céu, de onde o sol, a luz e as estrelas iluminam a terra.

E subimos ainda mais em espírito, meditando, celebrando e admirando tuas obras, e chegamos até o íntimo de nossas almas. E fomos além delas, para alcançar a região da abundância inesgotável, onde apascentas eternamente a Israel com o alimento da verdade, lá onde a vida é a própria Sabedoria, por quem foram criadas todas as coisas, as que já existem e as vindouras, sem que ela própria se crie a si mesma, pois existe agora como antes existiu e como sempre existirá. Antes, nela não há nem passado, nem futuro: ela apenas é, porque é eterna; mas ter sido ou haver de ser não é próprio do ser eterno.

E enquanto assim falávamos dessa Sabedoria e por ela suspirávamos, chegamos a tocá-la momentaneamente com supremo ímpeto de nosso coração; e, suspirando, deixando ali atadas as primícias de nosso espírito, e voltamos ao ruído vazio de nossos lábios, onde nasce e morre a palavra humana, em nada semelhante a teu Verbo, Senhor nosso, que subsiste em si sem envelhecer, renovando todas as coisas!

E dizíamos: Suponhamos que se calasse o tumulto da carne, as imagens da terra, da água, do ar e até dos céus; e que a própria alma se calasse, e se elevasse sobre si mesma não pensando mais em si; se calassem os sonhos e revelações imaginarias e, por fim, se calasse por completo toda língua, todo sinal, e tudo o que é fugaz – uma vez que todas as coisas dizem a quem sabe ouvi-las: Não fizemos a nós mesmas; fez-nos o que permanece eternamente – se, dito isto, todas se calassem, atentas a seu Criador; e se só ele falasse, não por suas obras, mas por si mesmo, de modo que ouvíssemos sua palavra, não por uma língua material, nem pela voz de um anjo, nem pelo ruído do trovão, nem por parábolas enigmáticas, mas o ouvíssemos a ele mesmo, a quem amamos nas suas criaturas, mas sem o intermédio delas, como agora acabamos de experimentar, atingindo em um relance a eterna Sabedoria, que permanece imutável sobre toda realidade, e supondo que essa visão se prolongasse, que todas as outras visões cessassem, e unicamente esta arrebatasse a alma de seu contemplador, e a absorvesse e abismasse em íntimas delícias, de modo que a vida eterna seja semelhante a este momento de intuição que nos fez suspirar, não seria isto a realização do entrar em gozo de teu Senhor? Mas quando se dará isto? Por acaso quando todos ressuscitarmos? Mas então não seremos todos transformados?

Tais coisas dizíamos, embora não deste modo, nem com estas palavras. Mas tu sabes, Senhor, que naquele dia, à medida que falávamos dessas coisas, quanto nos parecia vil este mundo, com todos os seus deleites – disse-me minha mãe: “Filho, quanto a mim, já nada me atrai nesta vida. Não sei o que faço ainda aqui, nem por que ainda estou aqui, se já se desvaneceram pra mim todas as esperanças do mundo. Uma só coisa me fazia desejar viver um pouco mais, e era ver-te católico antes de morrer. Deus me concedeu esta graça superabundantemente, pois te vejo desprezar a felicidade terrena para servi-lo. Que faço, pois, aqui?”

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Confissões, de Santo Agostinho. (Para o baixar o ebook, clique aqui.)

Um Prêmio Nobel e o Livro de Urântia

Kary Mullis

Anos atrás, quando tentei discutir supostos dados científicos do Livro de Urântia em comunidades e fóruns de “cientistas” brasileiros, fui ridicularizado. (Uma comunidade orkutiana de físicos até me proibiu de voltar ao tema.) Já o Prêmio Nobel de química Kary Mullis, por sua própria conta, deu a maior atenção ao livro, encontrando dados que o impressionaram, uma vez que o livro trouxe informações corretas com décadas de antecedência àquelas descobertas e ratificadas pela comunidade científica internacional. Veja o que ele diz:

“The Urantia Book was purportedly written by extraterrestrials and published in 1955. It has been freely available on the internet since 2001. Several scientific developments, unexpected in 1955, reported in 2005 in Science and Nature, and referenced below, were somehow, described rather precisely already in the Urantia Book. I have documented three cases here, but there are many contemporary scientific discoveries which were first posited as far as I can tell, in this rather large tome. There is much in here, the truth of which cannot be judged from the apparent truth of these several instances. The book claims a large number of authors. Much of it would be considered “politically incorrect” and might infuriate some people. I suggest that you not be shooting at the messenger; I am just reporting what I have observed.”

Vale lembrar que os tais escritores “extraterrestres” são tão alienígenas quanto um espírito costuma ser. Ou quanto um anjo é.

Em seu site, Mullis — que ao contrário de pseudo-cientistas brasileiros não se deixou cegar por burrice preconceitos (isso deve explicar seu prêmio Nobel) — apresenta alguns exemplos que lhe chamaram a atenção.

Screenwriting — Advice to Hollywood writers

peter kreeft

Palestra de Peter Kreeft, professor de filosofia no Boston College e no King’s College(New York), a respeito da arte de escrever roteiros de cinema.

Entre outras coisas, ele trata do poder da imaginação — sendo o cinema seu veículo mais absorvente —, da possibilidade de se influenciar para o bem ou para o mal, da influência divina no processo de criação, de como realmente se dá a originalidade, e assim por diante.

O áudio está em inglês.

[audio:http://www.peterkreeft.com/audio/37_screenwriting/peter-kreeft_screenwriting.mp3]

“Imagination is the single most powerful force in the human soul.” (Pascal)

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(Dica do Silvio Grimaldo.)

Credo de Dom Quixote

Salvador Dali - Don Quijote (1971)

Do livro “Páginas várias”, de Mário Ferreira dos Santos, Editora Logos, Junho de 1960:

“Creio na sabedoria divina criadora do cosmos; creio no cavalheirismo dos libertadores de bons prisioneiros; creio no amparo aos perseguidos, e aos necessitados, ávidos de justiça e de liberdade.

“Creio no orgulho ante os poderosos; na justiça ante os maus; na magnanimidade ante os bons e os mansos, na delicadeza ante as mulheres e as crianças.

“Creio na Coragem; no domínio dos desejos e no Amor Eterno.

“Creio na vida e na morte; amo as sombras dos bosques e a luz plena do meio-dia.

“Creio na Cavalaria Andante, realização suprema do homem bom e viril.

“Creio que há sempre um ideal a conquistar; feiticeiros que combater, duendes que enfrentar e monstros que destruir.

“Creio na necessidade do mal para maior glória do Bem.

“Creio na noite para maior glória do Sol, e no Sol para maior glória da Lua, inseparáveis amigos e confidentes dos campeadores do ideal.”

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