palavras aos homens e mulheres da Madrugada

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A “pílula vermelha” de Yuri Bezmenov: subversão, desmoralização, desestabilização, crise, normalização

Yuri Bezmenov

Abaixo, no primeiro vídeo, Yuri Bezmenov fala longamente sobre sua própria vida antes de abordar mais a fundo o tema que realmente importa: como destruir e dominar uma nação (ou várias nações) sem disparar um único tiro mediante a “subversão”. (Você se lembra quantas vezes ouviu a respeito de “subversivos” sem saber exatamente o que o termo queria dizer? No máximo, você imaginava Fernando Gabeira usando tanga de crochê em Ipanema — mas a coisa vai muito mais longe!) No segundo vídeo, que também já postei várias vezes tanto no Twitter quanto no Facebook — como diz Julie Terres, uma amiga, este é um vídeo de cabeceira –, Bezmenov vai direto ao assunto: explica detalhadamente as diversas fases da subversão, isto é, discorre sobre a desmoralização, a desestabilização, a crise e a normalização. Quem acredita que suas próprias concepções sobre religião, educação, sexualidade, cultura, “justiça social”, etc. são muito avançadas, espertas, esclarecidas e puras devia assistir a esta palestra para meditar sobre o quão “idiota útil” talvez esteja sendo…

Claro, a luta pelo poder no mundo já não possui exatamente os mesmos “protagonistas” citados, mas as técnicas descritas — que remontam a Sun Tzu (vide A Arte da Guerra) — continuam sendo utilizadas a torto e a direito, principalmente por aqueles que objetivam o estabelecimento de um governo mundial. (Na melhor das hipóteses, de uma hegemonia mundial.) Enfim, deixe de frescura, deixe de rotular quem entende do assunto de “teórico da conspiração” — como se conspirações não pudessem ocorrer até mesmo em sua cama (vide “amantes” e “largue sua mulher/marido para ficar comigo!”) — e assista à exposição de um especialista no assunto, um sujeito que passou metade da vida trabalhando para a KGB como um “enganador profissional”.

Bezmenov fala de sua vida e da fuga para o Ocidente:

Bezmenov descreve as quatro fases da subversão:

Northrop Frye: a autoridade profética no mundo moderno

Northrop Frye

« Milton, no Areopagitica, nos dá, talvez sem querer, uma pista sobre as fontes do elemento profético numa sociedade moderna. Elas podem aparecer através da palavra impressa, sobretudo na pena dos que despertam resistência e ressentimento na sociedade, por falarem com uma autoridade que esta reluta em reconhecer. Neste contexto uma tal autoridade não é infalível, mas ainda assim pode conter uma genuína antevisão. A tolerância para com mentes criativas, reconhecendo-as como potencialmente proféticas, é uma marca da maioria das sociedades maduras, mesmo se essa tolerância não possui padrões definidos de antemão nem postula a infalibilidade daquelas mentes. Portanto no mundo moderno, se algo corresponde à autoridade profética, é o crescimento do que antes chamamos de pluralismo cultural. Neste contexto um cientista, um historiador ou um artista podem pensar que seu assunto possui uma autoridade inerente. Na mesma linha de pensamento, reconhecem que podem realizar descobertas que entrem em conflito com o espírito socialmente predominante e que mesmo assim, diante da oposição por parte da sociedade, devem permanecer leais à sua matéria.

« Na Bíblia a profecia é uma visão abrangente da situação humana, medindo-a da criação à libertação final; é uma visão que demarca o que, em outros contextos, despertaria a imaginação criadora. Ela incorpora a perspectiva da sabedoria, ampliando-a. O sábio pensa na situação do homem como se esta fosse uma linha horizontal, formada pelo precedente, pela tradição, e avançando graças à prudência; o profeta vê o homem num estado de alienação provocado pelas distrações que lhe são próprias, no ponto mais baixo de uma curva em forma de U. Voltaremos a esta curva mais tarde, como a unidade narrativa na Bíblia. Ela (a curva) postula um estado original de felicidade relativa, e olha para diante, na esperança de uma restauração definitiva deste estado para pelo menos algum “sobrevivente”. O momento presente do sábio é o ponto em que se equilibram o passado e o futuro; as incertezas deste são minimizadas pela observância da lei que procede do passado. O momento presente do profeta é o de um filho pródigo alienado, um momento que rompeu com sua própria identidade no passado mas pode a ela retornar no futuro. Desse ponto de vista podemos ver que o Livro de Jó, embora seja classificado entre a literatura da sabedoria e inclua mesmo um elogio da própria sabedoria, não pode ser compreendido apenas como tal. Para ser compreendido ele precisa de uma perspectiva profética.»

Trecho do livro O Código dos Códigos, de Northrop Frye.

Da Beleza e Consolação — uma entrevista com Roger Scruton

Sobre o filósofo Roger Scruton.

O Messias, oratório de Georg Friedrich Händel

Completo.

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Vale a pena ver e ouvir de novo: Hallelujah, o 42º movimento apresentado como flashmob num shopping center do Canadá.

Para saber mais sobre o oratório O Messias clique aqui e aqui.

Chesterton fala sobre a diferença entre o paganismo e o cristianismo no que toca à alegria e à tristeza

G.K.Chesterton

« Dizem que o paganismo é uma religião de alegria e o cristianismo é de tristeza. Seria igualmente fácil provar que o paganismo é pura tristeza e o cristianismo pura alegria. Esses conflitos nada significam e não levam a lugar algum. Tudo o que é humano deve conter em si alegria e tristeza; a única questão que interessa é como os dois ingredientes são equilibrados e divididos. E a coisa realmente interessante é a seguinte, que o pagão sentia-se em geral cada vez mais feliz à medida que se aproximava da terra, mas cada vez mais triste à medida que se aproximava dos céus.

« A alegria do melhor paganismo, como na jocosidade de Catulo ou Teócrito, é, de fato, uma alegria eterna que nunca deve ser esquecida por uma humanidade grata. Mas é uma alegria totalmente voltada para os fatos da vida, não envolvendo a origem dela. Para o pagão, as menores coisas são doces como os menores riachos que irrompem da montanha; mas as coisas maiores são amargas como o mar. Quando o pagão olha para o verdadeiro âmago do cosmos, ele de súbito se sente gelado. Por trás dos deuses, que são meramente despóticos, sentam-se as parcas, que são mortais. Melhor dizendo, as parcas são piores que mortais; elas estão mortas.

« E quando os racionalistas dizem que o mundo antigo era mais esclarecido que o mundo cristão, do seu ponto de vista eles estão certos. Pois quando dizem "esclarecido" querem dizer "obscurecido" por um incurável desespero. É profundamente verdadeiro que o mundo antigo era mais moderno do que o cristão. O vínculo comum está no fato de que os antigos e os modernos sentiram-se infelizes acerca da existência, acerca de todos os fatos da vida, ao passo que os medievais sentiam-se felizes pelo menos a respeito disso.

« Admito francamente que os pagãos, assim como os modernos, eram apenas infelizes acerca da totalidade dos fatos da vida — eles eram muito alegres acerca de tudo o mais. Concedo que os cristãos da Idade Média viviam em paz com a totalidade dos fatos da vida — estavam em guerra com tudo o mais. Mas se a questão girar em torno do primeiro pivô do cosmos, então havia mais contentamento cósmico nas estreitas e sangrentas ruas de Florença do que no teatro de Atenas ou no jardim aberto de Epicuro. Giotto viveu numa cidade mais sombria do que Eurípides, mas ele viveu num universo mais alegre.

« A massa humana tem sido forçada a sentir-se alegre acerca de coisas pequenas, mas a entristecer-se acerca de coisas grandes. Apesar disso (apresento o meu último dogma como uma provocação), não é natural para o homem ser assim. O homem se identifica mais consigo mesmo, é mais parecido com o homem quando a alegria é a coisa fundamental dentro dele e a dor é superficial. A melancolia deveria ser um inocente interlúdio, um estado de espírito delicado e fugaz; a pulsação permanente da alma deveria ser o louvor. O pessimismo é, na melhor das hipóteses, um meio-feriado emocional; a alegria é a ruidosa labuta pela qual vivem todas as coisas.

« No entanto, de acordo com a aparente condição do homem na ótica do pagão ou do agnóstico, essa primeira necessidade da natureza humana nunca pode ser satisfeita.

« A alegria deveria ser expansiva; mas, para o agnóstico, ela deve ser contraída, deve restringir-se a alguém bem-sucedido neste mundo. A dor deveria ser uma concentração; mas, para o agnóstico, a desolação dela se espalha por uma eternidade inimaginável. Isso é o que chamo de nascer de cabeça para baixo. Pode-se na verdade dizer que o cético está de pernas para o ar, pois seus pés vão dançando virados para cima em vão frenesi, enquanto o cérebro está no abismo.

« Para o homem moderno, os céus estão realmente embaixo da terra. A explicação é simples: ele está de ponta-cabeça, o que constitui um pedestal pouco resistente para apoiar-se. Mas quando ele houver novamente descoberto os próprios pés, saberá disso. O cristianismo satisfaz de repente e à perfeição o instinto ancestral do homem de estar virado para cima; e o satisfaz plenamente neste sentido: com seu credo a alegria se torna algo gigantesco e a tristeza algo especial e pequeno.

« A abóbada acima de nós não é surda porque o universo é um idiota: seu silêncio não é o silêncio sem piedade de um mundo sem fim e sem destino. O silêncio que nos cerca é antes uma pequena e compassiva quietude como a súbita quietude no quarto de um enfermo. Talvez a tragédia nos seja permitida como uma espécie de comédia benigna: porque a frenética energia das coisas divinas nos derrubaria como uma farsa de bêbados. Podemos aceitar as próprias lágrimas mais facilmente do que poderíamos aceitar a tremenda leveza dos anjos. Assim ficamos sentados talvez num quarto estrelado e silencioso, enquanto a risada dos céus é forte demais para os nossos ouvidos.

« A alegria, que foi a pequena publicidade do pagão, é o gigantesco segredo do cristão. E no fechamento deste caótico volume torno a abrir o estranho livrinho do qual proveio o cristianismo; e novamente sinto-me assombrado por uma espécie de confirmação. A tremenda figura que enche os evangelhos ergue-se altaneira nesse respeito, como em todos os outros, acima de todos os pensadores que jamais se consideraram elevados. A compaixão dele era natural, quase casual. Os estóicos, antigos e modernos, orgulhavam-se de ocultar as próprias lágrimas. Ele nunca ocultou as suas; mostrou-as claramente no rosto aberto ante qualquer visão do dia-a-dia, como a visão distante de sua cidade natal. No entanto, alguma coisa ele ocultou. Solenes super-homens e diplomatas imperiais orgulham-se de conter a própria ira. Ele nunca a conteve. Arremessou móveis pela escadaria frontal do Templo e perguntou aos homens como eles esperavam escapar da danação do inferno. No entanto, alguma coisa ele ocultou. Digo-o com reverência; havia naquela chocante personalidade um fio que deve ser chamado de timidez. Havia algo que ele encobria constantemente por meio de um abrupto silêncio ou um súbito isolamento. Havia uma certa coisa que era demasiado grande para Deus nos mostrar quando ele pisou sobre esta nossa terra. Às vezes imagino que era a sua alegria.»
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Ortodoxia, de G. K. Chesterton.

Religião e Sociedades Secretas – podcast com Olavo de Carvalho

Há exatos seis anos, publiquei meu sexto podcast com o filósofo Olavo de Carvalho, no qual conversamos sobre “Religião e Sociedades Secretas”. (Veja os tópicos logo abaixo de cada parte.) Volto a postá-lo aqui, em duas partes, porque, dentre todos os gravados naquele ano (2006), foi exatamente este o que mais me marcou. A primeira parte — que chamo de “lado A” — foi ouvida, até o momento, mais de 97 mil vezes. A segunda parte (“lado B”), por alguma razão que desconheço, foi danificada no YouTube quando já havia sido ouvida mais de 22 mil vezes. Voltei a postá-la novamente e, hoje, conta 5160 acessos. Não sei o porquê dessa discrepância de acessos entre as duas partes, mas a questão é que considero a segunda parte tão ou mais importante que a primeira. Creio que, na primeira, Olavo prepara a mesa enquanto que, na segunda, ele nos serve um banquete. O que Olavo fala sobre a fé, nessa segunda parte, é algo que jamais esquecerei. Não sugiro que seja ouvida antes ou em vez da primeira parte, mas, sim, que não seja deixada de lado. Você irá entender o porquê.


Neste sexto bate-papo, “lado A”, o filósofo Olavo de Carvalho discorre sobre os seguintes temas: Islã, Frithjof Schuon, religião comparada, judaísmo/hinduísmo/budismo; Conceito de religião, revelação e doutrina; Cristianismo, o indiví­duo, fé e crença; a filosofia perene; Martin Heidegger; religião evolutiva?; Islã e terrorismo; queda do Império Romano, os feudos, a Igreja Católica, racionalismo e moral cristã; Emmanuel Swedenborg, a Bí­blia; ateus; sociedades secretas, Maçonaria, os Illuminati; René Guénon, o caos e a unidade do Islã, califado mundial; etc.


Neste sexto podcast, “lado B”, Olavo discorre sobre os seguintes tópicos: pensamento epidérmico e pensamento profundo; diferença entre Deus e Alá; fraternidade; a conversão acentuadamente “civil” islâmica e a conversão estritamente espiritual cristã; o Verbo Divino; Fé e confiança; a conversão não é instantânea; a Salvação; o pensamento de Jacques Derrida como testemunho da perdição da alma; a Imortalidade; o Livro de Urântia (Urantia Book); a Bí­blia e a literatura; a Bí­blia como chave para interpretação da vida pessoal; alma fechada e alma aberta; a diferença entre o poeta e o louco; “Deus não é objeto para o pensamento”; “o desconstrucionismo, o marxismo e a psicanálise defendem-se da crí­tica tal como o faz o homossexualismo”; unidade planetária e globalização; abismos culturais; George Soros; “os quatro graus de credibilidade”; maturidade intelectual; uma dica de filme; o lançamento de sua rádio online (TrueOutspeak).

Antônio Vieira fala sobre nosso poder de condicionar o “segundo nascimento”

Grandes cousas e lastimosamente grandes haverá que ver e considerar naquele acto da ressurreição universal! Mas entre todas as considerações a que me parece mais própria deste lugar e mais digna de sentimento, é esta. E quanta gente bem nascida se verá naquele dia mal ressuscitada! Entre a ressurreição natural e a sobrenatural há uma grande diferença: que na ressurreição natural cada um ressuscita como nasce; na ressurreição sobrenatural, cada um ressuscita como vive; na ressurreição natural nasce Pedro e ressuscita Pedro; na ressurreição sobrenatural nasce pescador, e ressuscita príncipe: Sedebitis in regeneratione judicantes duodecim tribus Israel. Oh que grande consolação esta para aqueles a quem não alcançou a fortuna dos altos nascimentos! Bem me parecia a mim que não podia faltar Deus a dar uma grande satisfação no dia do juízo à desigualdade com que nascem os homens, sendo todos da mesma natureza. Não se faz agravo na desigualdade do nascer, a quem se deu a eleição de ressuscitar. A ressurreição é um segundo nascimento com alvedrio.

Tanta propriedade considerou Job neste segundo nascimento, que até outro pai, outra mãe disse que tínhamos na sepultura: Putredini dixi: pater meus es tu; mater mea et soror mea, vermibus. Temos outro pai e outra mãe na sepultura em que jazem nossos ossos, porque ali somos outra vez gerados, de ali saímos outra vez nascidos. Notai agora: Statutum est hominibus semel mori: «Quis Deus que morrêssemos uma só vez», e que nascêssemos duas, porque, como o morrer bem dependia de nosso alvedrio, bastava uma só morte; mas como o nascer bem não estava na nossa mão, eram necessários dois nascimentos, para que pudéssemos emendar no segundo tudo o que nos faltasse no primeiro. Bem pudera Deus fazer que nascessem os homens todos iguais, mas ordenou sua providência, que houvesse no Mundo esta mal sofrida desigualdade, para que a mesma dor do primeiro nascimento nos excitasse à melhoria do segundo.

Homens humildes e desprezados do povo, boa nova! Se a natureza ou a fortuna foi escassa convosco no nascimento, sabei que ainda haveis de nascer outra vez, e tão honradamente como quiserdes; então emendareis a natureza, então vos vingareis da fortuna. Que maior vingança da fortuna que as mudanças tão notáveis, que se verão naquele dia! (…) Vede se há-de dar Deus boa satisfação aos homens da desigualdade com que hoje nascem. O ser bem nascido, que é uma vaidade que se acaba com a vida, é verdade que o não pôs Deus na nossa mão; mas o ser bem ressuscitado, que é aquela nobreza que há-de durar por toda a eternidade, essa deixou Deus no alvedrio de cada um. No nascimento somos filhos de nossos pais, na ressurreição seremos filhos de nossas obras. E que seja mal ressuscitado por culpa sua quem foi bem nascido sem merecimento seu! Lástima grande. Ressuscitar bem sobre haver nascido mal, é emendar a fortuna; ressuscitar mal sobre haver nascido bem, é pior que degenerar da natureza. Que ressuscite bem David sobre nascer de Jessé, grande glória do filho de um pastor; mas que ressuscite mal Absalão sobre nascer de David, grande afronta do filho de um rei! Se os homens se prezam tanto de ser bem nascidos, como fazem tão pouco caso de ser bem ressuscitados? Nenhuma cousa trazem na boca os grandes mais ordinariamente, que as obrigações com que nasceram. E aposto eu que mui poucos sabem quais são estas obrigações. Nascer bem é obrigação de ressuscitar melhor. Estas são as obrigações com que nascestes.

O mais bem nascido homem que houve, nem pode haver, foi Cristo; ninguém teve melhor pai, nem melhor mãe; e foi notar Santo Agostinho que, se Cristo nasceu bem, ressuscitou melhor: Gloriosior est ista ,nativitas, quam illa: illa cortus mortale genuit, ista redidit immortale. Cristo, diz Santo Agostinho, «nasceu mais nobremente no segundo nascimento que no primeiro: no primeiro nascimento nasceu mortal e passível; no segundo, que foi a sua ressurreição, nasceu impassível e imortal» Eis aqui as obrigações dos bem nascidos — nascerem a segunda vez melhor do que nasceram a primeira. Se Deus pusera na mão do homem o nascer, quem houvera, por bom que fosse, que não se fizesse muito melhor? Pois este é o caso em que estamos. Se havemos de tornar a nascer, porque não trabalharemos muito por nascer muito honradamente? Não nascer honrado no primeiro nascimento, tem a desculpa de que «Deus nos fez» Ipse fecit nos, Não nascer honrado no segundo, nenhuma desculpa tem: tem a glória de sermos nós os que nos fizemos: Ipsi nos. Que glória será naquele dia para um homem poder tomar para si em melhor sentido o elogio do grande Baptista: Inter natos mulierum non surrexit major:«Entre os nascidos das mulheres nenhum ressuscitou maior». Ser o maior dos nascidos, em quanto nascido, é pequeno louvor e de pouca dura; ser o maior dos nascidos, em quanto ressuscitado, isso é verdadeiramente o ser maior. Na nossa mão está, se o quisermos ser. Nesta vida o mais venturoso pode nascer filho do rei; na outra vida todos os que quiserem podem nascer filhos do mesmo Deus: Dedit eis potestatem filios Dei fieri. E que não sejam isto considerações, senão verdade e Fé católica! Bendito seja aquele Senhor, que é nossa ressurreição e nossa vida: Ego sum resurrectio et vita.

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Segunda parte do Sermão da Primeira Dominga do Advento, de Pe. Antônio Vieira, pregado na Capela Real, no ano de 1650.

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